Direção de fotografia para séries de TV

Bianca

Por Danielle de Noronha

As séries brasileiras para televisão estão conquistando mais espaço na programação aberta e, principalmente, na programação a cabo – que emerge como um local em crescimento para este tipo de produção. Segundo o Informe de Acompanhamento de Mercado que monitora a programação dos canais pagos, da Ancine, em 2011 foram exibidas 74 obras seriadas brasileiras, que inclui documentários, ficções, videomusicais e séries de variedades ancoradas por um apresentador. Com o incentivo da nova Lei da TV Paga (12.485/2011), este número deve aumentar ainda mais, já que a lei garante a presença de mais conteúdos nacionais e independentes nos canais de TV a cabo.

O crescimento da demanda para esse tipo de conteúdo, mexe também com o mercado cinematográfico brasileiro. Assim como todos os estilos de produção audiovisual, o formato possui dinâmicas próprias, impõe desafios e exige da equipe técnica diferentes maneiras de pensar o fazer cinematográfico. A facilidade que o tele-espectador possui para mudar de canal e a forma como a série é dividida são exemplos que demonstram alguns dos paradigmas que o formato conota, que solicita da equipe novas possibilidades e ferramentas para contar histórias.

No caso da fotografia, os profissionais também têm se dedicado a aproveitar suas experiências em outros formatos, como longas-metragens ficcionais e documentários, acrescentando os diferentes aprendizados que o trabalho em séries de TV possibilita. As diversas relações com o tempo – seja ele o narrativo ou para o desenvolvimento do trabalho – se apresentam como a principal diferença entre a produção de séries para televisão e outras formas de contar histórias a partir de imagens.

Pensando em termos de longa-metragem, o tempo para a produção de episódios de séries de TV é muito mais curto, como explica o diretor de fotografia Marcelo Trotta, ABC, que fotografou episódios de Alice, Som & Fúria, Antônia, Ó, Paí, ó, O Amor em 4 Atos e Destino SP: “A fotografia para séries de TV combina métodos, ferramentas e estéticas vindos do Cinema num passo de filmagem mais acelerado. Enquanto num longa se filma 2, 3 páginas de roteiro por dia, num seriado de TV normalmente são por volta de 5, sendo que já fiz projetos rodando 7 páginas por dia”.

O tempo também foi a principal diferença destacada por Gustavo Hadba, ABC, diretor de fotografia das séries Mandrake, Histórias do Brasil e Viver para contar. O fotógrafo pontua que este fator ainda é diferente em relação ao envolvimento da equipe técnica e dos atores: “Num longa-metragem, em geral, a equipe técnica tem um envolvimento de mais tempo, os próprios atores tem mais tempo pra ficar no set. Nas séries as coisas já são diferentes”.

Mandrake
Cena da série Mandrake da HBO com Marcos Palmeira e Luís Carlos Miele

Em relação à dramaturgia, a série de TV possui uma velocidade narrativa que está entre a do cinema e a da publicidade, como conta Rodrigo Monte, ABC, responsável pela direção de fotografia de episódios das séries Descolados, Mulher Invisível e Sessão de Terapia. Para o fotógrafo, “uma particularidade importante em relação ao formato é o fato da série de TV trabalhar o roteiro de forma horizontal e vertical ao mesmo tempo. Sendo a vertical a capacidade de andar com a história dentro de um mesmo episódio e a horizontal, na totalidade de episódios. Levamos isso em conta na hora de pontuar as cenas, de escolher os planos”, gerando uma dramaturgia especifica para o formato.

Séries em digital

Seguindo a tendência mundial de todas as produções audiovisuais, o digital também tem atuado na produção das séries e, em relação ao tempo, tem facilitado o trabalho principalmente na pós-produção. Para filmar a última temporada de Mandrake (HBO) e Destino SP (HBO), Hadba e Trotta, respectivamente, optaram por utilizar a câmera Arri Alexa. Para Trotta, a câmera é a que possui o look mais cinematográfico dentro do que existe hoje no cinema digital: “a Alexa tem uma enorme latitude, um render fiel e agradável dos tons de pele e um workflow descomplicado. Baixo nível de ruído a ISO 800 e a alta tolerância à manipulação no grading são outros fatores que também me agradam bastante. Filmar a ISO 800 é muito libertador, você consegue bons níveis de luz com ferramentas de iluminação pequenas e mais fáceis de esconder”, explica.

Mandrake 1
Gustavo Hadba durante filmagem de Mandrake

Para a pós-produção de Destino SP, Trotta explica que a série foi filmada em Loc C 4444 “que me parece um ótimo codec para produções para TV”, e complementa: “Eu podia abrir os arquivos de câmera em meu laptop e checar qualquer dúvida. É um formato que funciona para edição e depois partimos para o color grading no Lustre da O2 com o Foca”. Em Mandrake, Hadba utilizou o snowflake, que faz marcação de luz prévia. “Todo final do dia de filmagem, eu e o diretor dávamos uma pré-marcada nas luzes, assim quando a gente foi marcar a luz final foi tudo muito mais rápido, muito mais encaminhado por conta disso”, explica o diretor de fotografia.

Já Rodrigo Monte optou em filmar a série Sessão Terapia (GNT) com umaSony F3 em log-s, com gravador externo da sound divices, captando em Pro Res 4:2:2. “Escolhemos esse workflow em busca da melhor qualidade dentro de um cronograma de entrega de 45 episódios em 4 meses de pós, incluindo a edição”, conta o diretor de fotografia. A pós foi realizada em Apple Pro Res 4:2:2. Incluindo a edição, sonorização e marcação de cor em um color pelo colorista Alex Yoshinaga.

Rodrigo
Diretor de fotografia Rodrigo Monte com os atores André Frateschi e Mariana Lima durante filmagem de Sessão de Terapia

Mesmo que grande parte das TVs do país ainda seja no formato 4:3, o aspecto do formato final das séries de TV a cabo é em 16:9 e, como acredita Trotta, aos poucos a TV aberta também está adotando esse standard. Mesmo que não seja possível controlar a qualidade do que é exibido para o espectador, o material final é entregue em HD, priorizando a melhor qualidade possível: “as emissoras transmitem e o que cada TV mostra em cada casa, é incontrolável. É só você entrar numa loja de TVs, que normalmente estão passando a mesma coisa em aparelhos de TV diferentes para ver como esse resultado pode ser os mais distintos, de acordo com cada fabricante, modelo do aparelho e etc”, pontua Trotta.

A produção de séries de TV no Brasil está em crescimento e se apresenta como um excelente espaço para o exercício cinematográfico, tanto para equipes, diretores e roteirista, como considera Hadba: “Podemos praticar a cinematografia com uma qualidade de produção boa e o prazo mais apertado obriga todo mundo a ser mais organizado. Levamos pra TV um pouco do que aprendemos no Cinema e ganhamos de volta horas de voo”.

Para Monte, estamos num momento importante de mudança na TV, onde produtoras independentes estão cada vez mais criando conteúdos dentro das grades de TV, seja aberta ou a cabo. “Quanto mais séries se produzir melhor elas ficarão. A gente aqui no Brasil está começando com esse formato, que é muito bom de testar coisas e ousar”, complementa Hadba.

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