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Sessão ABC 2002

Desmundo

Data: 01 de dezembro de 2002
Evento gratuito

FICHA TÉCNICA: 

Direção: Alain Fresnot
Direção de fotografia: Pedro Farkas
Direção de arte: Adrian Cooper e Francisco Andrade
Montagem: Junior Caroni, Mayalu Oliveira e Alain Fresnot
Som: Romeu Quinto, Roberto Ferraz

Texto de André Moncaio – GT Projeção ABC-SP
Agradecimentos à Ronnie Giovanni pela gravação deste debate

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Aconteceu em dezembro a última projeção paulistana de 2002. O filme exibido foi o ainda inédito Desmundo, de Alain Fresnot, fotografado por Pedro Farkas

O excelente grupo: Pedro Farkas na fotografia; Pedro Ionescu, operando a câmera sempre de maneira precisa; Marjorie Gueller no figurino e Adrian Cooper que se uniu a Francisco Andrade na direção de arte, veio de “Memórias Póstumas de Brás Cubas” e conseguiu criar uma imagem e um universo deslumbrantes, porém sem exageros.

Filmado em super-35mm, uma bitola bastante incomum no Brasil por causa do seu custo, o filme surpreende pela fina e perfeita “reconstituição” do Brasil do século XVI. Se o papel do cenógrafo é criar a ambientação da história e, num filme de época, buscar a maior verossimilhança possível, a dupla Adrian Cooper e Francisco Andrade realizou seu trabalho de maneira exemplar.

O orçamento de R$6 milhões, certamente ajudou bastante – inclusive para construir um engenho, uma vila e uma caravela em Ubatuba, onde foi rodado o filme. Apesar disso, criatividade e competência não vêm do dinheiro, estão em cada um.

O filme tem ainda outros méritos. Entre eles, está a interpretação da jovem Simone Spoladore, no papel da órfã Oribela, e dos atores veteranos, Osmar Prado e Berta Zemel. E, sem dúvida, a primorosa fotografia de Pedro Farkas aliada à direção de Alain Fresnot.

Farkas já construiu uma lista de filmes “não plugados”

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“Memórias Póstumas de Brás Cubas” ; “A Ostra e O Vento; “Inocência” e “O Monge e a Filha do Carrasco” – isto é, filmes de época ou sem luz elétrica, e adquiriu uma intimidade no trato com a luz natural e a sua re-criação. Em Desmundo, a simplicidade da fotografia e as soluções práticas encontradas por Pedro produziram um resultado puro e limpo, dando prazer ao espectador que assiste ao filme.
Nem tudo são rosasElogios à parte, o filme teve também suas dificuldades, é claro. Uma delas foi na anamorfização do negativos – passagem do super-35mm para o 35mm tradicional – aqui no Brasil: “É lindo, né? É gostoso de ver, o resultado é legal, o mérito é do Alain (Fresnot, diretor do filme) ele que insistiu. Porque eu jurei que nunca mais ia fazer super-35mm.

Eu acho super bonito o resultado , mas o negativo sofre muito, você vê as perdas” comentou Pedro Farkas. Para as cópias foram feitos testes comparativos nos laboratórios Líder – do Rio de Janeiro e CFI – dos EUA. Como o resultado foi semelhante decidiram fazer o processamento da cópia no Brasil mesmo Farkas ficou meses marcando a luz.

Finalmente com a marcação de luz pronta foi feito o primeiro rolo, que foi assistido no Cinesesc. Porém, a cópia não foi aprovada e foram para os EUA realizar a finalização.

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“A seqüência final começa amanhecendo, aí tinha uma perseguição à cavalo na praia e tinha que ter uma passagem de tempo, e eu fiquei quebrando a cabeça com o Alain, pra fazer um plano de passagem de tempo.

Aí um dia o marcador de luz (Gill Carreras, do Laboratório CFI) me ligou e disse: o que você acha de deixar toda a seqüência no amanhecer? E eu achei fantástico isso, e foi idéia do cara. Não dá pra descrever o que ele trouxe pro filme.Fiquei muito impressionado com o trabalho dele”, lembrou Pedro.

O fotógrafo contou que também se surpreendeu com o resultado da cor de certos planos em que apareciam o céu azul, o sol e a mata e perguntou para o marcador de luz: “Por que eu fiquei 6 meses no Brasil tentando acertar e não veio essa cor? E ele me disse: é a química, o banho é diferente.

Eu achei engraçada essa resposta, nunca tinha imaginado isso. Pra mim a química era uma coisa padrão. Mas lá eles têm um departamento de química que faz pesquisas…”

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Outro obstáculo foi a grande quantidade de planos externos, o que gerou um tempo de filmagem além do previsto: 10 semanas. O rendimento de 14 planos por dia ocorreu por causa do clima inconstante da região e da necessidade de sol para rodar diversas cenas. ” A gente ficou uma tarde inteira esperando o sol sair para filmar aquele plano da grua, que tem o Osmar Prado, a grua vira, aparece o carro, aparece a chaminé”.


Praia

Pedro Farkas comentou sobre as dificuldades para iluminar uma praia à noite: “Tinha a praia com o mar e o cara andando à cavalo. A gente puxava um cabo de uns 50 metros, e colocava uns 4 minibruts e deixava. O resto ficou escuro. Então você acredita, você entra na onda. Teve essa discussão: até aonde você iluminou a praia? É infinito. Já tinha tido isso na ‘Ostra e o Vento’. Eu acho super bonito.”

Ainda sobre as cenas na praia, o fotógrafo revelou: “A gente mandou fazer em Ubatuba um triciclo, com direção e uma plataforma atrás. Foi muito usado na praia. Ficava o Fabrício (Tadeu Lima, operador de steadycam) em cima, a gente colocava um três tabelas e o Julinho (maquinista) ia empurrando para acompanhar os cavalos. ”

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Negativos e Câmera

O fotógrafo filmou com os negativos da FUJI F-250D e F-500. Este último foi utilizado nas cenas noturnas que tinham lamparinas.”O Adrian (Cooper, diretor de arte) mandou fazer as velas ‘reforçadas’, com mais de um pavio. E eu usei um refletor rebatido, e com gelatina para complementar a lamparina. Raramente ela é a fonte de luz Em algumas cenas eu usei aquela bola japonesa”.

Pedro levantou a importante questão da verossimilhança da iluminação para o espectador: “Porque que quando ele vem com lamparina está tudo escuro e na sala da casa é mais claro? É muito complicado isso. É uma questão de realismo da fonte de luz.

Porque que não é sempre daquele jeito? Porque uma hora você induz o espectador a achar que a lamparina iluminou daquele jeito e depois diz que agora ela iluminou mais? Você pode supor que tenha mais lamparinas na casa, mas é complicado isso” refletiu o fotógrafo. “Tem uma outra cena que ele vem com a lamparina e tem uma luz rebatida em cima, é toda no dimmer e tem um isopor embaixo, na cama. Eu acho falso, sempre que eu vejo eu acho falso, é até uma contradição, pelo que eu sei.”.

A equipe contou com uma câmera ARRI BL 535 para filmar. Pedro Ionescu, fotógrafo e operador de câmera já calejado, foi o responsável por rodar também alguns planos, enquanto Pedro Farkas preparava outros.

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Referências?

Pedro Farkas é um adepto da prática, do fazer em criação, quer dizer, não gosta muito de ficar teorizando e criando conceitos. “Pra mim existe o lado de enfrentar o problema, ver qual é a limitação, o que pode e o que não pode. Isso que é fotografia” disse o fotógrafo na época das filmagens de Desmundo.

“Eu acho que a referência é o trabalho do Adrian (Cooper, diretor de arte), os dados do início do trabalho de iluminação vêm do trabalho do Adrian. Por exemplo, o quartinho dela (a órfã Oribela, por Simone Spoladore) é um quartinho fechado com uma janelinha. Está proposta a fonte de luz.”

Filmes de época

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O fotógrafo Carlos Pacheco comentou sobre a complicada junção das externas com a internas nos filmes de época: “Você está trabalhando uma luz interna mais suave e de repente, se depara com uma porta, com uma janela, onde essa diferença é muito grande. E eu achei que você foi corajoso”.

Uma das escolhas de Farkas para o filme foi exatamente ter os interiores bem escuros e os exteriores mais claros: “Quando se vê lá fora vai estar claro, vai estar estourado”.

Pedro Farkas também falou sobre a sua “fuga” do verde: “Acho que em filme de época não combina muito o verde. A gente tentou usar filtro, fizemos testes e acabamos abandonando, tentamos filmar o menos possível o verde, eu acho estranho o verde na vila (a área urbana do filme), nas viagens tudo bem, o verde faz parte da exuberância”

Desmundo teve, sem dúvida alguma, uma equipe de primeira em todos os departamentos, desde a elétrica até o elenco. Agora, resta ao grande público aguardar o mês de maio de 2003 (data prevista do lançamento) para conferir esta superprodução.

Uma Vida Em Segredo

Data: 01 de outubro de 2002
Evento gratuito

FICHA TÉCNICA: 

Direção: Suzana Amaral
Direção de fotografia: Lauro Escorel
Direção de arte: Adrian Cooper
Montagem: Verónica Sáenz
Som: Jorge Saldanha

“Uma Vida em Segredo” é um exemplo claro e clássico de cinema.”
Carlos Pacheco

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Premiado com a melhor fotografia – para Lauro Escorel – e melhor direção de arte -para Adrian Cooper -, no XII Cine Ceará, em junho de 2002, Uma Vida em Segredo foi o quinto filme a participar das projeções paulistanas da ABC.

Bem diferente de muitos filmes recentemente lançados no mercado brasileiro, em que a tecnologia de ponta da pós-produção digital tem reinado, este filme vai na contramão não só dessa “onda tecnológica” – que é claramente bem vinda – mas também no que diz respeito ao seu ritmo e à sua linguagem.

“É um filme minimalista”, disse Lauro Escorel no debate, lembrando a conhecida expressão da diretora Suzana Amaral: menos é mais. “E essa máxima permeia todo o projeto” completou.

Adequação

“Um Vida em Segredo é uma proposta de uma diretora que eu embarquei e tive imenso prazer, mas não é um filme que a gente vai falar da última geração tecnológica ou de uma edição super moderna.” lembrou Lauro, falando da fundamental adequação e sintonia que é necessária em cada projeto que se entra. “Faz parte do nosso oficio entender a proposta do filme e se adequar a ele, ver como você pode ajudar e de que coisas você tira partido como fotógrafo.”

Suzana Amaral

A delicada relação com a diretora Suzana Amaral é um ponto importante a ser abordado. É dessa relação que nasceu a linguagem fotográfica do filme: os enquadramentos estudados, os poucos, mas cuidadosos, movimentos de câmera, em meio a uma maioria de planos estáticos. Enfim, as soluções para os obstáculos, e também os problemas. “O filme vive dessas sutilezas”.

Lauro contou que na pré-produção, Suzana e Assunção Hernandes (produtora do filme) lhe disseram que era um filme super simples, sem produção nenhuma, sem locação, e que não precisaria de um diretor de arte. Assim, o primeiro papel do fotógrafo foi convencê-las de que era fundamental um diretor de arte, exatamente pelo filme ser tão simples. Ainda bem! Pois como disse Lauro: “O trabalho com o Adrian Cooper e a figurinista Marjorie Geller foi da maior importância para o resultado conseguido na construção da imagem do filme” e também para o merecido prêmio.

Depois de aceito o diretor de arte, qual foi o desespero de Lauro e Adrian ao ver que a casa escolhida era muito pequena e estava muito aquém do que o filme precisava. Porém, o produtor executivo, o cineasta João Batista de Andrade, permitiu que eles derrubassem paredes, criassem janelas, pintassem portas e a casa foi toda transformada de acordo com as necessidades do filme. Ao fim das filmagens, para a surpresa da equipe, a dona da casa pediu que tudo voltasse a seus lugares.

Ainda durante as filmagens, a relação com a direção de arte manteve-se delicada: a diretora, passava no final da tarde pelo set e tirava elementos cenográficos que haviam sido colocados no cenário por Adrian Cooper ao longo do dia: ” Na fazenda da minha tia no interior de Minas não tinha tapete. Então não vai ter tapete.”

Tomadas extras

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Na sequência em que Biela caminha na chuva à procura do cachorro Vismundo, Lauro fez planos de cobertura que

Suzana não queria. Para esta cena ela rodou apenas um único plano geral do travelling, deu-se por satisfeita e disse que ia embora descansar. Lauro achou importante ter planos de cobertura com outras lentes (enquadramentos) para a montagem e acabou rodando-os sem a diretora. As tomadas foram usadas na edição final, mas com muito custo. Lauro teve que “bater o pé” junto com a montadora, Verónica Sáenz, para conseguir colocá-las no filme.

“Todas essas coisas se refletem no filme de alguma maneira. Ele tem a cara da Suzana Amaral, uma diretora de 71 anos de idade, com um outro tempo, que direcionou a energia dela para coisas muito específicas, como a direção da Sabrina (Greve, atriz principal)”.

Lauro comentou algo curioso a respeito da cena em que o primo de Biela discute com sua mulher se fará em casa o jogo com os amigos . Na primeira vez em que foi filmada, esta cena foi feita à noite por que o roteiro dizia “interior-noite”. Ele contou que quando viu o copião, a reação da diretora foi : “essa cena está muito escura pra esse momento do filme.” Apesar de estar super bonita, com luz de lampião, “toda certinha” – como o fotógrafo completou – na cabeça de Suzana a cena estava errada em relação àquele momento: “Então apesar do filme ser pequeno, de baixo orçamento, a gente, num final de dia, refez a cena como ‘interior -dia’ e isso deu até uma coerência maior em relação ao percurso fotográfico do filme.”

Biela: Sintonia

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“Quando eu comecei a fazer o filme, eu percebi que a minha primeira matéria era o rosto da Sabrina. Eu vou viajar, eu vou curtir, é a atriz do filme. Tudo gira em torno dela, dos sentimentos, da vida interior dela, e é essa que vai ser a minha viagem.”

Houve uma cumplicidade muito grande entre a câmera, a luz e a atriz, que segundo Lauro Escorel pode ser notada nas cenas: ” O posicionamento da atriz em relação a câmera, em relação à fonte de luz, a maneira que a câmera se aproxima e se afasta dela, isso foi uma coisa super pensada, super planejada. E eu contei com uma pessoa que veio de teatro, foi o primeiro filme que ela fez. Criou-se uma empatia, uma confiança e acho que isso transparece no filme.”

Lauro conta que assim que acabava de rodar o plano Sabrina olhava para ele como se dizendo “Parei na marca certa? A luz chegou no meu rosto como você queria?” Para ele essa foi a grande curtição de fazer o filme.

O filme trata da trajetória da personagem Biela, uma introspectiva e peculiar moça da roça que, quando seus pais morrem, vai morar na casa do primo – e tutor – na cidade. A evolução dos conflitos internos e externos de Biela na vida na cidade são trabalhados sutilmente pela luz, pelo figurino e, claro, pela interpretação primorosa de Sabrina Greve, tudo seguindo o ritmo reflexivo ditado pela diretora.

Estudos

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Comentou-se que o fotógrafo Lauro Escorel explorou muito bem o “rosto Modigliani” de Biela – referindo-se aos rostos longilíneos representados nas telas deste pintor. Foi ainda questionado se ele havia feito algum estudo a respeito.

Lauro disse que uma referência importante foi a maneira como Vermeer retratou em seus quadros, as mulheres no espaço: a colocação do corpo, dos rosto e das mãos. “As mulheres de Vermeer têm um certo mistério”. Outra referência à Vermeer, foi a luz difusa e com direção vinda das janelas, que a própria cenografia (no caso, a locação) sugeria. A série de fotos intitulada ” Lella ” do fotógrafo Èdouard Boubat foi também uma importante fonte de estudo para o posicionamento da câmera em relação à atriz Sabrina Greve.

Exatamente como o ânimo da personagem, após ser preterida pelo noivo de ocasião.” comentou o fotógrafo Carlos Ebert em um texto sobre o filme, intitulado: “Janelas, a Lei do Quadrado da Distância, Vermeer e outras observações”, publicado no site da ABC. “No decorrer da narrativa, a personagem cada vez mais deslocada nas dependências ‘sociais’ da casa, muda-se para um quarto de despejo fora. Ai, as imagens tornam-se mais sombrias. Menos luz ingressa do exterior.” completa Ebert em outro momento do texto.

Varicom

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O debate discorreu principalmente sobre linguagem e estética deixando um pouco de lado a questão técnica, bastante abordada nos últimos debates. Apesar disso, as técnicas trabalhadas por Lauro Escorel neste filme foram questionadas pelos presentes. Ele utilizou um aparelho chamado Varicom, que através de uma pequena lâmpada emite luz diretamente no negativo no momento em que ele está sendo exposto na câmera. Isto diminui o contraste e permite mais informação nas baixas luzes, “deixando os pretos respirarem”. Somado a isso ele “esquentou” a luz com gelatinas âmbar (CTO). Lauro já havia utilizado magnificamente a técnica do Varicom no filme “O Xangô de Baker Street” porém, segundo ele, abusou um pouco dela: “Têm alguns momentos que eu acho que usei o Varicom mais do que eu precisava”.

Para Lauro, a cinematografia moderna está calcada no contraste, na procura desesperada do contraste: “Desde que eu comecei a fotografar filmes só se fala na pureza, na beleza dos pretos. E de repente nos últimos anos começou a me dar um certo tédio em relação a isso, eu comecei a querer ver mais dentro do preto, a me perguntar se o preto poderia ter uma cor e foi aí que eu cheguei no Varicom”

Outra questão abordada, foi o uso da luz difusa recortada, uma técnica usada com maestria por Lauro Escorel. O diretor de fotografia, Marcelo Corpani, comentou que essa técnica era uma busca pessoal sua e apenas conseguiu realizá-la no seu quinto longa, que acabara de rodar: “Você faz isso lindamente”.

Tecnologia Digital: também é solução

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Apesar de não ter sido “programada”, a tecnologia digital resolveu um grande problema. Na cena em que Biela rasga as roupas na frente do espelho, o supervisor de efeitos especiais, Marcelo Siqueira, da Teleimage, literalmente apagou um pêlo que estava na janela da câmera, justamente na tomada que a diretora mais gostou. O trabalho – que utilizou uma técnica chamada “rostoscopia” – teve que ser feito quadro a quadro, já que havia movimento na cena. Um agravante foi o fato deste plano estar montado no meio de uma sequência com o negativo original, o que certamente provocaria comparações. Por fim, a tarefa foi realizada com sucesso e Lauro Escorel agradeceu o árduo trabalho de Marcelo durante o debate, comentando também : “Alguém percebeu a diferença?” Pois é, a ferramenta digital acabou tendo seu uso até mesmo em um filme que não se propunha à utilizá-la. Ainda bem que agora, no Brasil, podemos ter acesso a ela.

Negativos

Lauro usou negativos FUJI F-250D, para as cenas diurnas – 80% do filme, F-500 para as noturnas e na sequência de apresentação – em que Biela e seu tio percorrem o campo à cavalo – usou o F-64D, pois estava prevista a colocação dos créditos iniciais do filme. Porém, ele contou que a diretora mudou de idéia na fase de finalização e não os colocou. Acabou ficando longa…

Copião

O assunto “copião” é recorrente nos debates e, claro, não foi esquecido neste. Para Lauro: “Estão abrindo mão de ver copião projetado. Acho um empobrecimento do processo. A troca é menor. A produção costuma querer economizar um média de 25/30 mil reais, fazendo um copião eletrônico, o que num filme de R$1 milhão é uma bobagem”

Hugo Kovensky, outro experiente e excelente fotógrafo (Bicho de Sete Cabeças, Kenoma e Um Céu de Estrelas, entre outros) comentou: “Muita gente está trabalhando para o telecine. Não se faz mais um copião com luz única. Se ficasse escuro no copião você sabia que era porque você tinha feito assim.”

Lauro Escorel completou: “Eu não estou fazendo apologia de um modo clássico de fazer cinema, mas enquanto meu meio de reprodução, o meu resultado final for a tela grande de um cinema, com cópias, a minha referência tem que ser o copião em película.” Mesmo porque, por melhor que seja o monitor de vídeo, ele é absurdamente menor do que a tela de cinema, e essa imensa diferença de se ver um copião na tela grande “influi na sensação e no seu julgamento”, como foi ressaltado no debate.

Exteriores x Interiores

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Foi bastante comentado pelos presentes “que os exteriores não tem a mesma força que os interiores”, que as locações não foram “bem escolhidas” e que são mais pobres do que os cenários. A esse respeito, Lauro esclareceu: “Nós domesticamos a casa. É difícil encontrar exteriores sem postes, fios elétricos e outras referências à vida contemporânea”.

Além disso, houve muito mais investimento nos interiores, pois a prioridade da diretora era a atriz Sabrina Greve, e não o ambiente, comentou Lauro Escorel. A busca e a atenção estavam voltadas para o caminho que a personagem principal percorria dentro de si mesma, apesar deste caminho “esbarrar” no mundo exterior à ela e à seus segredos.

Cidade De Deus

Data: 01 de setembro de 2002
Evento gratuito

FICHA TÉCNICA: 

Direção: Fernando Meirelles, Kátia Lund
Direção de fotografia: César Charlone
Direção de arte: Tulé Peake
Montagem: Daniel Resende
Som: Guilherme Ayrosa, Paulo Ricardo Nunes, Martin Hernandez, Alessandro Laroca, Rudi Piti, Adam Sawelson.
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A quarta projeção paulistana da ABC ocorreu em setembro na Sala Cinemateca, com o polêmico Cidade de Deus, de Fernando Meirellles e Kátia Lund. O fotógrafo do filme, César Charlone, esteve presente e participou do estimulante debate. A mesa estava cheia. Além dele, a presença do técnico de som Guilherme Ayrosa, do eletricista Sérgio Isidoro, do colorista Sérgio Pasqualino e do supervisor de finalização dos laboratórios Megacolor e dos Estúdios Mega, José Augusto de Blasiis, enriqueceu bastante a conversa.

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Lançado no Festival de Cannes deste ano (2002) e em cartaz, desde 30 de agosto, nas salas brasileiras, o filme veio provocando diversas críticas. Muito por tratar de um tema que agride nossos olhos e nossa apatia em relação ao tráfico de drogas e à vida nas favelas. O filme é contundente e às vezes até agressivo pela maneira seca que apresenta a realidade daqueles que estão vivendo no seu dia-a-dia a força do tráfico, muito mais que todos nós que podemos assisti-lo e criticá-lo.

Críticas e elogios

MV Bill, rapper morador da comunidade de Cidade de Deus, que em 2000 lançou o videoclipe de “Soldado do Morro”, no qual via-se garotos com fuzis em punho pela favela da Cidade Deus, no Rio de Janeiro, tem uma opinião bastante oposta à ovação geral do filme. Em entrevista à Ilustrada, caderno de cultura da Folha de S. Paulo, o rapper disse a respeito do filme:”Ele não traz nenhum benefício à Cidade de Deus. E mostra um certo preconceito sim, de que a favela é a grande causadora da violência nas grandes capitais”.

A pesquisadora Ivana Bentes também criticou enormemente o filme, em uma matéria para o jornal O Estado de S. Paulo em 31 de agosto de 2002 – pelo que foi também muito criticada: “Cidade de Deus, de Fernando Meirelles (2002), adaptado do romance de Paulo Lins é o suprassumo desse novo brutalismo, aqui tendo como referência, entre outros, o filme de gângster, as sagas da máfia, o épico-espetacular e a estética MTV. (…) A favela é mostrada de forma totalmente isolada do resto da cidade, como um território autônomo. Em momento algum se pode supor que o tráfico de drogas se sustenta e desenvolve (arma, dinheiro, proteção policial) porque tem uma base fora da favela. Esse fora não existe no filme.”

Por outro lado, Arnaldo Jabor, em uma crítica escrita em 27 de agosto de 2002 na sua coluna no Caderno 2 do mesmo jornal, tem uma opinião bem diferente. “Não. Cidade de Deus não é um filme, apenas. É um fato importante, é um acontecimento crucial, um furo na consciência nacional. Fui ver o filme e saí modificado. Tenho a impressão de que esse filme não se diluirá como um espetáculo digerível. Nós não vemos esse filme; esse filme nos vê”, disse Jabor. o imenso público do filme também gostou. Sem dúvida os elogios são fartos.

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Entendo que a narração em off do personagem principal é um ponto que “atrapalha” o filme. A locução do ator não estimula o espectador, até mesmo cansando e distraindo a atenção. Assim como a estrutura não-linear da montagem – clara influência de Tarantino e Scorsese – me apareceu um pouco cansativa, não pela estrutura em si, pois estes cineastas americanos fizeram uso magistral dessa linguagem, mas por tornar a narrativa do filme uma espécie de carrossel, de brincadeira, uma historinha fictícia quando na verdade ele trata de situações seriíssimas de violência e pobreza.

Mas, qual a posição do diretor Fernando Meirelles? Para ele “Cidade de Deus é apenas um filme. Um corte entre os milhares possíveis sobre o tema ou entre as centenas possíveis partindo do livro de Paulo Lins. Só isso.Tenho repetido incansavelmente que Cidade de Deus não tem nada de novo e nem pretende ter. Usei apenas experiências narrativas conhecidas há um século. Só foi feito com competência por eu ter conseguido reunir a equipe dos meus sonhos. O difícil para alguns críticos é ter que reconhecer que a equipe é competente por vir da publicidade onde praticam e experimentam muito. São pessoas que filmam, montam e constroem cenários diariamente há anos. Esta é uma vantagem que levamos em relação aos cineastas ‘puros”‘.

Ele diz ainda: “O filme não foi feito para o “mercado”. Foi feito para atingir um grande número de pessoas. Honestamente acho que não interessa a ninguém o que um paulista classe média acha ou deixa de achar sobre o problema da exclusão ou da violência no Brasil. A classe média já tem muito espaço para se manifestar”.

Enfim, independente dos prós e contras, um grande valor do filme é existir, gerar toda esta discussão e encher as salas de cinema com um público novo, ganhando o lugar do cinema de Hollywood.

São inquestionáveis a excelente interpretação dos atores e a fotografia de César Charlone. Mais uma vez a tecnologia de pós -produção digital, com suas possibilidades de intervenção criativa, foi muito bem utilizada. E em conjunto com a “tensa” câmera na mão, alternada com belíssimos planos sobre um tripé, cria uma linguagem imagética bastante rica.

Guia: Palace II e os testes

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Exibido logo após a sessão de Cidade de Deus, o curta-metragem Palace II, produzido para a TV Globo pouco antes das filmagens do longa-metragem, foi um verdadeiro laboratório tanto para a direção quanto para a fotografia.

Para o diretor Fernando Meirelles, a produção do programa para a Globo foi muito importante, pois ele estava inseguro em relação aos atores, por eles serem amadores. César contou que foram utilizados 4 tipos de emulsões 5245 50D; 5246 250D; 5279 500T e 5289 800T da Kodak de películas 16mm e 35mm,para testar as reações dos negativos, as diversas situações de filmagem e seus resultados no processo de finalização. Isso transformou o curta, como disse o fotógrafo, em uma colcha de retalhos, tanto de luz, como de câmera, em momentos no tripé em outros na mão, e também de negativos e texturas diferentes. Para o Cidade de Deus, ele descartou o negativo 5289 800T e acrescentou o negativo 5274 200T.

Durante o processo de filmagem de Cidade de Deus, o curta Palace II foi uma referência constante para o fotógrafo César Charlone, um verdadeiro”guia”. Após a exibição na TV Globo foi feito um transfer para 35mm e uma projeção no Cinesesc que teve um resultado excelente, na relação ao custo/benefício.

A partir disso, eles sentiram-se seguros, pois no telecine, poderiam”mexer” em eventuais situações extremas de filmagem. O telecine C-Reality e o colorista Sérgio Pasqualino foram realmente grandes “companheiros” de César e Fernando. Foram 9 semanas de telecine, sem contar as 50 horas usadas para testes com fotografias still. O colorista contou que foram muito interessantes os testes com o Palace II, pois eles abusaram muito, usaram muitas máscaras. Enfim, eles experimentaram, algo fundamental para criação.

José Augusto, supervisor de finalização dos Laboratórios Megacolor/Estúdios Mega, disse que apesar da longa experiência com transfer digital de longas metragens – no total 30 – nunca havia feito um filme tão testado como Cidade de Deus. Mas segundo ele, “tudo tem um caminho pra ser pesquisado, tem uma novidade para ser encontrada. Estou muito orgulhoso de participar deste projeto, exatamente por ter tido essa grande oportunidade de pesquisa”. Inclusive porque a experiência com a finalização digital (transfer tape to film ou intermediação digital) do Cidade de Deus foi, e tem sido, usada nos projetos seguintes do laboratório.

Mais Telecine

Sobre o uso dessa ferramenta o fotógrafo disse: ” A gente começou a pensar a imagem como os caras do som pensam o som. Antigamente o cara captava o som criativo, já com intenção, pra deixar menos trabalho pra depois porque tinha menos ferramenta. Hoje em dia, com isso aí (o telecine), você capta tudo, toda a informação possível pro seu negativo, depois você vai trabalhar, você pode subexpor tudo que você quiser”

35mm e 16 mm

Na maior parte do filme foi usada uma câmera Aaton A-Minima (Super 16mm), adaptada pela Hagadê, com um visor de cristal líquido, para César Charlone que sempre operava a câmera, e em alguns momentos uma Arri II (35mm).

Foram rodadas 700 latas de negativos Kodak : 20% de 35mm e 80% de 16mm. César Charlone contou que no Palace II ele tinha preconceito com o 16mm: “Tudo que tivesse mais informação, plano geral com pessoas pequenininhas, prédios, janelinhas, ou planos com muitos móveis que a gente quisesse mais detalhe era 35mm”. Já sobre o Cidade de Deus ele disse que há trechos do filme em que não consegue distinguir o que é 35mm do que é 16mm. No telecine, após marcar a luz das tomadas em 35mm, César e o colorista Sérgio Pasqualino trabalhavam as tomadas em 16mm e tentavam igualá-las.

Na cena do Palace II, em que os garotos chegam para falar com os traficantes, ele filmou o plano geral com 35mm e os fechados com 16mm, acabou rodando um plano geral também com 16mm. César revelou, porém, que ficou surpreso ao ver a cena projetada, pois mesmo o colorista tendo montado todos os planos com 16mm o resultado ficou ótimo: “O critério que eu tinha tido no Palace (II) eu relativisei um pouco no Cidade (de Deus)”.

Estrutura

César contou que havia muita tensão no set por causa da locação das filmagens. A maioria das seqüências foi feita no Conjunto Habitacional de Sepetiba, portanto fora dos becos do Morro Santa Marta, onde foram rodadas as seqüências de guerra entre gangues e das perseguições. Ainda assim, a equipe (de produção) tinha sempre que ter um plano B: “Ficção e realidade se misturaram no set”. Todos os interiores foram rodados em estúdio, menos os bares e a seqüência do assalto no motel, que foram filmados nas próprias locações.

Filmando para os atores

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“Tínhamos que tratar o filme como documentário, o som tinha essa preocupação, a imagem tinha essa preocupação. A gente não podia pretender, ah, vamos fazer o garoto vir até aqui essa marca (sic)” , disse o fotógrafo César Charlone e completou: ” O que comandava o set era a dinâmica dos meninos (os atores).” Nesse ponto a pós-produção digital, pois permitiu deixar as tomadas de decisão a fase de finalização, dando agilidade ao set de filmagem.

O técnico de som, Guilherme Ayrosa, disse que tinha que sempre se prevenir e deixar os atores o mais à vontade possível, por isso quase não usaram (microfone de) lapela: “Eles não sabiam o roteiro, era um trabalho bem documental mesmo”. Em certos momentos, inclusive, por pedido do diretor de fotografia, foi colocado um microfone na câmera – como numa câmera de vídeo “para torná-la mais jornalística”.

Ele disse também que foi feita muito pouca dublagem. Apenas em situações inevitáveis, como, por exemplo, quando estavam filmando na Cidade Alta e havia uma pessoa muito próxima da cena e que não queria desligar o rádio de forma alguma.

Na cena do baile foi colocada música na filmagem e foram utilizados “animadores” na pista de dança. Usaram músicas que no final entraram no filme. Foi criada uma estrutura de play-back móvel com um amplificador pequeno no steadicam para os ensaios. Na hora de rodar, abaixava-se o som e os atores mantinham o ritmo.

Limites

“Dentro dessa proposta de buscar uma coisa documental, quando eu discuti o cenário com o Tulé (Peak, diretor de arte) e pedi para ele colocar teto fixo, pra eu não cair na tentação de arrancar o teto e enfiar uma luz por cima”.

O colorista Sergio Pasqualino contou que fez muito poucas fusões de luz (mudança no brilho/exposição da imagem feita eletronicamente no telecine). Em uma cena dentro da casa, o ator saía do escuro e ia para o claro e seu rosto estourava: O César não quis “arrumar”.

O Invasor

Data: 01 de maio de 2002
Evento gratuito

FICHA TÉCNICA: 

Direção: Beto Brant
Direção de fotografia: Toca Seabra
Direção de arte: Yuki Sato
Montagem: Manga Campion e Willen Dias
Som: Louis Robin, Roberto Ferraz e Armando Torres Jr

O novo filme de Beto Brant trouxe, além da revelação “dramatúrgica” do cantor dos Titãs, Paulo Miklos, que interpretou o papel principal, o fato de ter utilizado a tecnologia do HDTV para todo o processo de finalização do filme.

Após a projeção em 35mm, o público pôde assistir a alguns trechos do que foi captado originalmente em Super 16mm, antes do transfer para o HDTV.

O diretor de fotografia Toca Seabra veio do Rio de Janeiro para o debate que contou também com a presença de José Augusto de Blasiis, o supervisor de finalização dos Estúdios Mega, que realizou o blow-up digital do filme – ou seja, transferiu o negativo Super 16mm original para vídeo digital de alta definição (High Definition) e depois imprimiu em película 35mm.

Invasor06

Toca acumula seis filmes como Diretor de Fotografia, em seu curriculum, mas diz que “O Invasor” foi o melhor roteiro que apareceu na sua frente em toda a vida. Isto foi determinante ele topar a verdadeira aventura de filmar esta história repleta de longos planos-sequência de até 10 minutos (!!) e complexos movimentos de câmera feitos sempre com a câmera na mão.

É claro que, como ele próprio disse, “o filme só foi possível por causa do esforço de toda a equipe, E o Beto (Brant, o diretor) É um imenso catalisador”.
O fotógrafo reforçou diversas vezes que “entrou nessa” por acreditar na história e ter total confiança no diretor, afinal o baixíssimo orçamento não era atrativo para ninguém: “Eu nunca fiz um filme assim, é uma coisa louca”.

Toca trabalhou planos de 360º, quase sem iluminar as locações, e com o diafragma literalmente no limite da abertura máxima – ele conta que brincava com a 1ª Assistente de Câmera, Kika Cunha, quando ela lhe perguntava qual era o diafragma – sempre T1.4 nas noturnas.

Assim, o fato de ter usado a tecnologia HDTV na pós-produção, sem dúvida foi decisivo para a sua tranqüilidade, já que com todas essas dificuldades, fazer de outra maneira seria inviável, como ele próprio disse.

Opções práticas e estéticas

A respeito da opção de captar diretamente em vídeo digital High Definition (HD) Toca Seabra diz que quando entrou no filme já havia a proposta do diretor de fazer em 16mm:

“Eu pessoalmente detestaria ter feito em digital, até por que não tenho grande experiência com câmera digital e acho que o 16mm como suporte de captação é super flexível, abusável e confiável. Além do que uma câmera digital boa é caríssima e a não ser que eu tivesse uma grande experiência ela se tornaria uma vedete no set”.

Certamente, já que as câmeras HD são bastante grandes se comparadas às câmeras 16mm, precisam de uma série de ajustes e muitas vezes da presença de um engenheiro no set de filmagem.

Por outro lado, Toca teve que tomar algumas decisões práticas que inclusive influenciaram a estética do filme:

“De noite, muitas vezes o meu highlight estava no mínimo que a lente abria. O filme tem uns abusos de subexposição e como eles eram inevitáveis, nas conversas com o Beto e o Renato (Ciasca, produtor do filme) eu coloquei uma série pontos pra eles, e o Beto incorporou essas características teoricamente negativas, transformando isso em linguagem do filme ”.

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O fotógrafo usou os negativos Kodak 7246 250D para as cenas diurnas, 7279 500T e 7289 800T para as noturnas. O 800T nem sempre esteve lá, já que os lotes desta emulsão só chegaram no final das filmagens: “Na realidade, a gente usou o 800 quando teve o 800.

Não foi uma coisa que a gente escolheu. Ainda bem que nós tivemos sorte do 800 chegar nas seqüências cruciais”, disse o fotógrafo.

A câmera e as objetivas

A câmera utilizada foi uma Super 16mm: Aaton XTR S16 cedida pela Videofilmes – co-produtora do filme. Houve o uso eventual de uma segunda câmera que foi uma Aaton LTR 16mm do diretor de fotografia Marcelo Trotta, o Tintin, operada pelo próprio.

Toca usou um jogo de lentes Zeiss SuperSpeed: 9.5mm; 12mm 16mm e 25mm , segundo ele da série antiga, duas lentes zoom Canon uma 8-64mm e uma 11-165 mm e um jogo de lentes Nikkor que pertencem a ele próprio: 35mm, 50mm e 85mm todas f1.4 usadas quando precisou de lentes mais longas:

“São lentes problemáticas, que dão muito flare no contraluz, mas em vários planos foram a opção que a gente tinha de melhor. Seria melhor que a gente tivesse um jogo Zeiss completo mas a gente não tinha”.

Experiência única?

Uma questão bastante levantada foi se o fotógrafo repetiria essa experiência de filmar sem quase nenhuma estrutura. Ele respondeu que “se chegar um roteiro genial que nem esse e um diretor que eu tenha absoluta confiança eu faço, agora fora disso nem pensar”.

Levantou-se, também, a dúvida de até que ponto o baixo orçamento interferiu na linguagem, isto é, se a estética que está na tela foi por causa da pouca grana. Toca disse que mesmo com mais dinheiro teria seguido o caminho “que está lá”: “

Tinha uma questão da veracidade e do naturalismo que o Beto me colocou como artista e que eram fundamentais na estrutura narrativa do filme. Ele me disse: A história que eu quero contar necessita que as locações estejam funcionando normalmente, ela necessita que a câmera possa rodar 360 graus”.

Toca disse também que certamente era possível fazer de outra forma:

“Mas seria outro filme, feito por outra equipe. E o que poderia ser feito, se o orçamento fosse maior, seria recriar todos os sets em estúdio, alugar coberturas de apartamento e construir em cima. Mas o pulo de orçamento seria gigantesco, não seria um filme com 2 milhões, mas um filme com 10 milhões, muito longe da realidade dos filmes brasileiros.“

A pós-produção

Um outro item extremamente discutido foi o uso do HDTV e a pós-produção digital do filme. O que inclusive, em certo momento do debate, desembarcou em uma discussão a respeito da captação em vídeo digital, o tão falado Cinema Digital.

Toca Seabra defendeu a idéia de que “filmar sem luz” – muito erroneamente associada ao uso do vídeo digital – não é um caminho, apesar de ser um pensamento que vem crescendo entre as produtoras devido à fama de economia com a captação em HDTV, outra idéia errada, já que muitas vezes captar em HDTV pode sair muito mais caro do que em 35mm, por causa do caríssimo processo de film transfer – também conhecido como kinescopia.

Porém, no caso do “Invasor”, o uso desta tecnologia foi totalmente fundamental e acertado, como o próprio Toca explicou. Por outro lado, ficou claro que a utilização de processos digitais nos filmes nacionais – seja na pós-produção ou na captação – deve evidentemente ser estudada e pensada para cada projeto e não o contrário.

Afinal ainda não se tem um parâmetro definido e aceito por todos nessa área, nem no Brasil, nem em Hollywood.

José Augusto de Blasiis esclareceu alguns pontos a respeito do processo de film transfer e intermediação digital:

  • “Quando você vem de DV (o vídeo digital ‘standard’) a história é radicalmente diferente de quando você vem com base película principalmente na questão dos gammas (o contraste) e na questão da saturação”.
  • “Nos EUA eles têm uma coisa que é o DATACINE – um telecine que converte a imagem da película em dados, não em vídeo como o HD. Agora, fazer um longa inteiro no Brasil com essa tecnologia é economicamente inviável. Eu acho que o HD é o tamanho da possibilidade do Brasil e a gente tem que trabalhar com ele, pelo menos por enquanto.”

Pensando na pós-produção em HD

Ao assistir os trechos dos originais em Super 16mm, os espectadores poderiam ter ficado surpresos se não fossem fotógrafos. Realmente percebeu-se em algumas cenas uma imagem muito menos contrastada e “mais clara”, já prevendo o uso do telecine.

A cor: saturação e desaturação

O fotógrafo revelou que em muitos momentos a cor era sugerida na captação e depois acentuada no telecine. Um bom exemplo são as cenas que se passam nos bares, na boate e nos apartamentos.

A desaturação das cores também foi uma opção e foi realizada na telecinagem do material Super16mm. As cenas do escritório de engenharia e dos personagens de Marco Ricca e Alexandre Borges receberam tratamento do colorista Ely Silva para “perder cor” e ganhar uma eventual e leve tonalidade verde.

Todo o tratamento de imagem – cor, textura, granulação, contraste – foi feito no C-Reality um telecine 2K com uma mesa de correção de cor DaVinci, e os efeitos especiais foram realizados nos programas Fire e Inferno.

A cena de Marina com Anísio na boate e a luz negra

Toca conta que nesta cena todas a luzes foram “gelatinadas” Ele usou a gelatina Congo Blue misturada com refletores HMIs de 200w, tubos de lâmpadas fluorescentes com gelatina verde foram colocados nas colunas e ‘’escondidos” por tules e pequenas lâmpadas foram espalhadas pelo bar com gelatinas coloridas.

Houve um pedido para que alguns figurantes fossem para a locação com roupas fluorescentes e depois no telecine “a gente deu uma pilotada violenta”.

O grão

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Perguntado se havia se preocupado em tirar o grão no telecine, Toca Seabra respondeu com humor: “Não, porque tinha cada grão que parecia uma abelha (…) a gente usou um pouco de noise reduction, mas simplesmente pra não ficar um ‘saci’. As locações se alternavam muito, são 28 locações, então a reação que o filme tinha pra cada locação era muito distinta e louca. Eu me preocupava muito mais com o desenho de luz, a luz tinha que ter uma direção e os atores tinham que estar bem. Agora, o tamanho que o grão ia vir, chegou uma hora que eu nem pensava nisso”.

José Augusto de Blasiis lembrou que há um limite muito tênue para usar o noise reduction (recurso do telecine que serve para reduzir o ruído de imagem), senão este efeito aparece, se torna uma trama eletrônica e acaba interferindo esteticamente na imagem.

“No caso do Invasor, o grão e o contraste eram ‘bem-vindos’ (…) A gente passou por uma experiência com o César Charlone no ‘Cidade de Deus’, uma experiência bastante diversa dessa. O Charlone tinha muitos problemas com o grão eletrônico, com qualquer tipo de interferência, então foi uma busca da gente chegar num meio termo em que desaparecesse o que era visível pro olho dele e só sobrasse o grão cinematográfico, mesmo passando pelo meio eletrônico“.

Ele revelou que filmes como “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain” e “Onze Homens e um Segredo” estão cheios de efeitos digitais e de ruído, mas esses efeitos estão em um lugar que não chamam a atenção, há sempre um ator ou uma ação em primeiro plano impedindo que o espectador perceba a intervenção.

José Augusto contou também que foram feitos vários telecines com as principais seqüências para se escolher a luz. Essas sessões de telecine geraram o que se chama de frame store, uma série de fotogramas que foram impressos na película e serviram de “guia” para o fotógrafo.

“Puxar” os negativos – De volta aos processos ópticos.

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Em algumas cenas em que o fotógrafo usou o negativo 7246-250D da Kodak, ele teve que “puxar’’ o filme, por não estar usando refletores e ter que aproveitar a luz presente nas locações. A sequência de abertura do filme em que os sócios vão ao bar da periferia encontrar com o matador foi uma das situações:

“Na tarde em que estávamos filmando uma tempestade escureceu muito o final da tarde nos forçando a puxar 2 stops”.

“O 500 (500T 7279, negativo 16mm de 500 ISO da Kodak) eu puxei uma vez só e foi só meio stop. O 800 não foi necessário puxar porque ele lê um absurdo, inclusive a seqüência da boate, que eu tinha muito medo, a Martha (Reis dos Laboratórios MEGACOLOR) fez testes sucessivos e se não me engano a gente revelou a 640ASA” – (1/3 de stop subrevelado).

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Como não teve tempo de fazer testes de negativo, Toca disse que nas seqüências em que tinha dúvida tirou alguns metros de rolos de negativo exposto com trechos que não valiam e passou para a Martha Reis, que fez os testes para descobrir aonde eles podiam chegar.

Apesar de todas as dificuldades técnicas, o experiente (e corajoso) diretor de fotografia Toca Seabra conseguiu realizar um trabalho fotográfico extremamente criativo e que se encaixou muito bem na linguagem “suja” do filme ao percorrer realidades aparentemente distantes.

Quanto ao conteúdo, o filme não vai ao fundo da questão social na cidade de São Paulo, mas ao menos abre caminho para a discussão dos problemas ao alcançar o grande público sem abrir mão da verdade.

FICHA TÉCNICA COMPLETA: 

Lista de links
(Na ordem de aparição no texto)
“O Invasor” – http://www2.uol.com.br/oinvasor
Beto Brant – http://us.imdb.com/Name?Brant,+Beto
HDTV – http://www.ee.washington.edu/conselec/CE/kuhn/hdtv/95×5.htm
Toca Seabra – http://us.imdb.com/Name?Seabra,+Toca
Estúdios Mega – http://www.estudiosmega.com.br
7246 250D – http://www.kodak.com/US/en/motion/products/negative/5246.shtml
7279 500T – http://www.kodak.com/US/en/motion/products/negative/5279.shtml
7289 800T – http://www.kodak.com/US/en/motion/products/negative/5289.shtml
Aaton XTR S16 – http://www.aaton.com/products/cameras/xtr/index.html
Zeiss – http://www.zeiss.de/C12567A8003B58B9?Open
C-Reality – http://www.htvinc.net/c_reality.html
Fire – http://www.discreet.com/products/fire
Inferno – http://www.discreet.com/products/inferno
Congo Blue – http://www.leefilters.com/LPFD.asp?PageID=234

Equipe

Fotografia e Câmera
Toca Seabra
Direção de Arte
Yukio Sato
Figurino
Juliana Prysthon
Maquiagem
Gabi Moraes
1º Assistente de câmera
Kika Cunha (4 1/2 semanas) e Cristiano Conceição (1 1/2 semana)
2º Assistente de câmera
Wilson Boni
Video Assist
Manga Campion
Maquinista
Rogério Footscandle e Ug
Eletricistas
Café e assistente (4 semanas)
Idelfonso e assistente (2 semanas)
Colorista
Ely Silva
Laboratório
Martha Reis / Megacolor
Supervisão
Zé Augusto de Blasiis

Equipamento de câmera
1 Aaton XTR S16 w/ Video Assist Sistem
3 400′ mags
1 Sachtler Video 20 Head & Legs
1 SET SUPERSPEED ZEISS 1.4 PRIMES
9,5 / 12 / 16 / 25 mm
1 SET DE NIKKOR 1.4 PRIMES
35 / 50 / 85 mm
1 8 – 64mm Cannon Zoom
1 11-165mm Cannon Zoom
1 Set de 85 + 1 set de ND’s

Lista de luz 
TUNGSTÊNIO
2 Minibrutes 6 lamps
1 2 Kw fresnel
2 2 Kw abertos
2 1Kw fresnel
4 1Kw abertos
2 650 w Arri
4 300 w Arri

Obs: todos os refletores acima completos com tripé, barndoor, screen, saco de areia

KINOFLO BANKS
110v / 40w lamps (4ft / 122cm)
2 2 x 40w / double
4 1 x 40w / single
110 v / 20w lamps (2ft / 60 cm )
2 4 X 20w lite / 4bank
2 2 x 20w lite / double
12v / 6w Micro-Flo (9 in / 21,2 cm )
2 1 x 6w lite ( 3 Mini-Flo 131-120 kits)
Lighter adaptor

Obs: todos c/ Daylight e Tungsten lamps

2 KINOS 10 x 40w ( 122 cm )
1 2,5 Par HMI

Acessórios
4 Bandeiras francesas
6 Bandeira de pano 1x 0.5
6 braços c/articul.p/bandeira
4 Gobos c/ base
4 Manfrotto Magic Arms
12 Garras Ianiro (Universal)
12 Garras Lowell
12 Garras Supergarra
12 Garras jacaré de mola
4 Sargentos C c/luva
4 tripés Century
4 Tripés Baby (de luva)
4 Tripés Mini Baby
6 folhas de isopor 2×1
12 folhas de isopor 1 x 0.5
1 butterfly 2 x 2 mt

Bellini E A Esfinge

Data: 01 de fevereiro de 2002
Evento gratuito

FICHA TÉCNICA: 

Direção: Roberto Santucci Filho
Direção de fotografia: Jacob Solitrenick
Direção de arte: Paulo Flaksman
Montagem: Roberto Santucci Filho
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O primeiro mérito de ”Bellini e a Esfinge” talvez implique no fato de ser um filme de um gênero absolutamente ignorado, ainda que popular, pelo cinema brasileiro: o policial. Nos últimos anos, vimos”Bufo & Spalanzani” fotografado por Breno Silveira e o “O Dia da Caça” fotografado por Toca Seabra, mas certamente a fotografia de Jacob Solitrenick, para o thriller de Roberto Santucci, também brilha e merece a sua devida atenção e discussão.

Jacob cursou Zootecnia, mas sonhava em trabalhar com cinema. “A Marvada Carne” foi a chance de juntar as coisas. Trabalhou como produtor de set e de cenografia, assistente de câmera e finalmente direção de fotografia.

Durante um debate na Cinemateca Brasileira em São Paulo, logo após a primeira Projeção da ABC com o filme “Bellini e a Esfinge”, foram discutidos alguns pontos importantes da fotografia do filme e Jacob esclareceu os diversos questionamentos a respeito de sua obra.

Utilizando os negativos da Kodak 5289 800 ASA nas noturnas, 5479 500 ASA em noturnas e diurnas/internas, e 5274 200 ASA nas diurnas/externas, e tendo que trabalhar contra o tempo: “20 planos por dia”, este fotógrafo criou uma interessante atmosfera para o roteiro de Alexandre Plosk. O resultado é surpreendente, segundo os fotógrafos presentes na projeção. O belo trabalho com a latitude e a densidade dos pretos foram pontos que também chamaram atenção dos presentes, ainda que o”cuidado” em se trabalhar com um negativo como o 800 ASA tenha sido bastante ressaltada. A instabilidade de um negativo tão sensível foi considerada perigosa por alguns deles.

Sem copião, mas com testes

Trabalhar sem assistir o copião não foi uma novidade para o fotógrafo. Quando foi 2 º assistente de câmera do diretor de fotografia Pedro Farkas, no filme”Ele, o boto”, ele comenta que ficou impressionado com o fato do fotógrafo não assistir o copião: “Eu não entendia como ele podia ter tal domínio do que fazia”.

Quando foi filmar o seu primeiro longa “Latitude Zero” – em cartaz nos cinemas paulistas e cariocas ““ realizado em um garimpo abandonado, Jacob tentou a todo custo assistir o material telecinado em BETA, já que o baixíssimo orçamento impedia que isso fosse feito em película, mas nem isso foi possível, e ele teve que assistir em VHS ” que não dá absolutamente nenhuma noção do que vai para tela. Depois, no filme “Bellini e a Esfinge”, poder estar na telecinagem “já era um luxo”, segundo o fotógrafo.

Jacob comentou que é arriscado não usar copião e que depois acaba-se gastando para configurar o copião montado no corte final do filme. Prática esta que ele acha fundamental antes de se cortar o negativo, pois serve não só para checar a fotografia, mas principalmente o foco e também a montagem e a narrativa na tela grande.

Os testes dos negativos para o filme “Bellini e a Esfinge” foram essenciais e puderam ser realizados devido à  parceria com o Laboratório Megacolor, em que o filme foi processado.

Lá, ele fez os “speed tests” (testes de sensibilidade) e também os testes sensitométricos dos negativos. Esse filme estreou o Laboratório Megacolor na área de longa-metragem.

Na época eles estavam iniciando o processo de revelação e, segundo Jacob, foram muito companheiros:”Eu lembro que na primeira semana de filmagem a Martha e o Jony ainda estavam trabalhando para abaixar a curva do azul, que ainda estava alta no processo de revelação com os kits Kodak.”. De qualquer forma o negativo estava todo testado e ele tinha maior segurança do que estava fazendo.

Apesar disso, Jacob diz que vendo o positivo projetado achou que algumas cenas ficaram mais contrastadas do que esperava:”Por exemplo, todas as seqüências do escritório ficaram um pouco mais contrastadas do que eu fiz no telecine. No resto ficou como eu queria. Acho essa parte dos testes fundamental, onde deve-se traçar um paralelo muito preciso entre o contraste da cópia e o do telecine.”.

Jacob também conta que a partir dos testes no Megacolor ele decidiu superexpor 1/3 de f stop tanto no 500 ASA como no 800 ASA. Entretanto, se fosse hoje, ele disse que teria superexposto um pouquinho mais. “Não tanto pelo resultado na tela, onde os pretos estão bons, mas pela marcação de luz, que ficou na média geral abaixo dos 30″.

Filmando em locações

O filme foi todo feito em locações sem o conforto técnico do estúdio, que permite um maior domínio sobre a luz: “Eu gosto de estúdio, obviamente. Você pode construir seu universo, mas eu também gosto de locação, acho um desafio e tanto. Todas as cenas do escritório foram feitas em 5 dias e o sol mudava completamente, tinha um prédio na frente que virava um rebatedor de manhã, entrava uma luz fortíssima mas difusa, e de tarde entrava o sol direto, então eu tinha que dominar isso e manter a continuidade da luz.”

Opções

O keylight alto em algumas cenas foi uma das opções estéticas deste diretor de fotografia, como na contrastadíssima cena, em que o detetive Bellini entra e sai de zonas de altíssima luz para a escuridão enquanto caminha pelos corredores da Matarazzo para o encontro com a secretária. Essa cena foi rodada em 20 min, pois não havia mais tempo para ficar na locação,”era tudo ou nada”. Problemas de filmes de baixo orçamento….

Gelatinas Coloridas

Jacob revelou seu gosto por usar gelatinas coloridas (tanto as de efeito, como as “cosméticas”), o que foi feito por exemplo, nas diferentes cores adotadas tanto para o detetive Bellini, interpretado por Fábio Assunção – em que usou um suave azul-esverdeado – quanto para a prostituta Fátima – na comportada atuação de Malu Mader – iluminada com um rosa sutil: “Gosto bastante de trabalhar com cor, acho um desafio; pode ficar cafona, mas pode ser bem interessante. Acho que o filme permitia esse cromatismo”.

Direção de arte

Jacob diz que a relação com a direção de arte, feita por Paulo Flaksman foi muito interessante:”O que ele fez foi selecionar as locações e apresentá-las pra mim e pro diretor (…) ele fez isso muito bem! Depois ele voltou pro Rio e a assistente dele acompanhou as filmagens. Eu tive uma parceria muito grande com ela, por eu ter começado no cinema com cenografia sei que é uma parceria essencial. O nosso trabalho foi principalmente aproveitar a veracidade das locações e utilizá-las o melhor possível.”

Desfoque suave

Perguntado se gostava do desfoque das objetivas Zeiss Standard 50mm a f2.1 ou se preferia poder ter usado um diafragma mais fechado como f5.6, ele disse que o agrada muito: “Eu acho suave, ela perde o foco suavemente.” Em algumas cenas noturnas no apartamento do detetive Bellini ele usou as Zeiss Super-speed a f1.3 para captar ao máximo a cidade ao fundo. “Neste caso, com a 50mm e a câmera na mão, eu diria que aí sim é excessivo.”

KODAK 5289 800 ASA e 5279 500 ASA – A escolha de negativos com sensibilidades altas – ou”rápidos” como se diz – se deveu à  necessidade de agilidade nas locações. Além disso, a longa ordem do dia e o fato de ter um parque de luz reduzido para filmar as várias cenas noturnas deste policial influíram na escolha. Jacob filmou principalmente com um diafragma f2.1, à s vezes até f1.3 e apenas eventualmente indo até f2.8, para o desespero do 1º Assistente de Câmera, Rodrigo Toledo. Essa situação não é nada confortável para o foquista, pois um diafragma tão aberto não permite uma profundidade de campo favorável e qualquer erro aparece na tela:”Acho que o grande problema da gente não ter o copião projetado, é você não saber como está o seu foco”. Afinal em situações de take único e sem copião para controle, Jacob considerou o trabalho de Rodrigo excelente frente às diversas dificuldades.

Fotografia Adicional

Hélcio Nagamine, o Alemão, fez a fotografia adicional do filme realizada um ano depois das primeiras filmagens, mas que se encaixou muito bem nas imagens criadas por Jacob Solitrenick anteriormente. Um trabalho como esse, a fotografia adicional, é extremamente difícil uma vez que um fotógrafo continua o trabalho já pronto de outro profissional. “As diferenças ficaram por conta de outros aspectos como maquiagem, figurino e os próprios atores que já estavam diferentes. O lote de 5289 era outro e acho que isso foi o que causou uma pequena diferença de estrutura do grão entre o meu trabalho e o do Alemão”. Mesmo utilizando um negativo de um lote diferente, Alemão conseguiu realizar um belo trabalho.

A primeira projeção da ABC certamente foi um sucesso, com a sala cheia e um debate rico e produtivo. Espera-se que a próxima seja ainda melhor e que realmente estas projeções se tornem um bom hábito dos fotógrafos brasileiros, para que a discussão e a troca de informações sobre cinematografia fortaleçam a classe e ajudem a formar futuros profissionais.

FICHA TÉCNICA COMPLETA:

Direção de fotografia e operação de camera: Jacob Solitrenick
1º assistente de câmera: Rodrigo Toledo
2º assistente de câmera: Alexandre Samori
Video-assist: Pedro Eliezer
Still e making of: Jayne Stakflett
Motorista de câmera: Eduardo Duque
Direção de fotografia e operador de câmera adicional: Hélcio “Alemão” Nagamine
Operador de camera adicional: Pedro Ionescu
Chefe eletricista: Marcos de Noronha
Eletricista: Fernando Baia
Ajudante de elétrica: Thiago Bravo
Motorista de elétrica: Marcos Mezenga
Geradorista: João de Lima
Chefe Maquinista: Julinho Guimarães
Maquinista: Betão Quini
Ajudante de maquinária: Piu
Motorista de maquinária: Dorival
Equipamento de elétrica: Quanta e Cinecidade/Jamelão
Equipamento de maquinária: Motion
Equipamento de camera: Cameraman/Jacob Solitrenick
Gerador: Ricardo Dias Eventos
Negativo: Eastman-Kodak (5274/5279/5289)
Laboratório: Megacolor
Coordenação: José Augusto de Blasiis e Marta Reis
Acompanhamento: Jony H. H. Sogo
Marcador de luz: Norio Oshikawa
Montagem de negativo: Nilza de Moraes, Rosa Caviquiole e Priscila Caviquiole
Trucas: Wanderlei Gomes
Cópias: Curt-alex
Positivo: Eastman-Kodak (Vision 2383)
Telecine off-line: Estúdios Mega
Colorista: Junior
Finalização: Eliane Ferreira

Lista de luz e maquinária

Quanta 2 hmi par 1.2kw magnético com barn-door e jogo de lentes
1 hmi par 4kw eletrônico com barn-door e jogo de lentes
4 fresnel 300w arri com barn-door e jogo de difusores
4 fresnel 500w ltm com barn-door e jogo de difusores
4 fresnel 650w arri com barn-door e jogo de difusores
2 fresnel 1kw arri com barn-door e jogo de difusores
4 fresnel 1kw telem com barn-door e jogo de difusores
2 fresnel 2kw arri com barn-door e jogo de difusores
2 fresnel 2kw telem com barn-door e jogo de difusores
1 fresnel 5kw arri com barn-door e jogo de difusores
1 fresnel 5kw telem com barn-door e jogo de difusores
1 fresnel 10kw desisti com barn-door e jogo de difusores
1 soft-light 2kw arri com colméia
8 par 64 foco 1 com porta-gelatinas e jogode difusores
1 kino-flo 10 lâmpadas 1,20 (5500k e 3200k) com colméia
1 kino-flo 4 lâmpadas 1,20 (5500k e 3200k) com colméia
1 kino-flo 1 là‚mpada 1,20 (5500k e 3200k) com colméia
2 kino-flo 1 là‚mpada 0,60 (5500k e 3200k) com colméia
2 rebatedores rigido prata/prata
1 rebatedor espelho/prata
1 butterfly 2 x 2mts. Completo + prata
1 butterfly 4 x 4mts. Completo + prata
1 butterfly 6 x 6mts. Completo

Cinecidade

1 soft-light de 3 là‚mpadas / 2400w com haletas “cinecidade”
1 soft-light de 4 là‚mpadas / 3200w “cinecidade”
2 girafa-grua “cinecidade”
2 garras para poste
4 sargento expansivo atà‰ 0,60 mt. “Cinecidade”
5 sargentos para pontaletes “cinecidade”
5 sargentos para cano “cinecidade”

Gelatinas e extras

1 rolo de lee 201 full c.T.Blue
1 rolo de lee 202 1/2 c.T.Blue
1 rolo de lee 203 1/4 c.T.Blue
1 rolo de lee 205 1/2 c.T.Orange
1 rolo de lee 206 1/4 c.T.Orange
1 rolo de lee 246 quarter plus green
1 rolo de lee 249 quarter minus green
1 rolo de lee 255 hollywood frost
1 rolo de lee 410 opal frost
1 rolo de lee 250 half white diffusion
15 folhas de gelatina lee coloridas variadas
2 rolos de lee 280 black foil
2 rolos de terkron rhodia 50 microns 1,10 x10 mts.
2 sprays anti-reflexo

Maquinária

1 dolly fischer 11
6 trilhos retos
4 trilhos curvos

Câmera

arriflex 35bl5 evolution com aaton-code

Abril Despedaçado

Data: 07 de janeiro de 2002
Evento gratuito

FICHA TÉCNICA: 

Direção: Walter Salles
Direção de fotografia: Walter Carvalho
Direção de arte: Cássio Amarante
Montagem: Isabelle Rathery
Som: Felix Andrew, François Groult, Waldir Xavier e François Musy
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No mês de julho de 2002 ocorreu a terceira projeção paulistana da ABC, com o filme Abril Despedaçado, dirigido por Walter Salles e fotografado por Walter Carvalho. O fotógrafo veio do Rio de Janeiro para o debate que ocorreu logo após a sessão. Foi uma oportunidade não só de discutir a fotografia do filme, mas também de conhecer melhor os artífices e as idéias do diretor de fotografia mais “badalado” do momento. Também estava presente o diretor de arte, Cássio Amarante, que realizou um excelente trabalho nos belíssimos cenários e figurinos.

Agradecimentos à Eliza Capai

O filme conta a luta entre duas famílias do sertão da Bahia, uma tragédia que perdura por várias gerações em um interminável ciclo de vingança e morte.

Vivendo num mundo à parte da sociedade, a família Breves – que tem Ravi Ramos Lacerda no papel do menino Pacú; Rodrigo Santoro como Tonho; Rita Assemany interpretando a mãe e José Dumont como o pai – transita entre a bolandeira, o tacho de rapadura e o destino: “inspirados como bois no pasto, inspirados, bem alimentados e castos”.

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Como os bois que giram sozinhos, e surpreendem o menino Pacú, em uma manhã besta. No entanto, a chegada de brincantes na cidade mais próxima, quebra a estabilidade da família e derruba a barreira entre os mundos, interrompendo o ciclo de mortes.

O diretor de fotografia Walter Carvalho conseguiu, através da imagem, dar a dimensão da opressão e da falta de perspectivas em que viviam esses indivíduos. O forte contraste – com belíssimos e profundos pretos -, a luz vindo de uma só direção (Eu tomaria a licença de chamá-lo de um “Caravaggio sertanejo”, já que este pintor trabalhava a luz dessa maneira e colocava em suas telas religiosas personagens do povo ao invés de nobres) expressam a maneira como este artista da imagem construiu a linguagem fotográfica do filme.

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Em muitas cenas – como aquela em que o pai bate em Tonho, Walter Carvalho utilizou apenas a luz de um candeeiro para iluminar os rosto dos atores: “eu só pedia pra chegar perto do rosto, tanto que quando o candeeiro apaga com a violência do pai batendo no filho some a luz do Rodrigo (Santoro, ator do filme)”. Apenas no final, ao escolher o outro caminho e seguir em direção de sua sereia “Tonho/Ravi” encontra o branco, a liberdade na praia, e os contrastes se desvanecem na areia.

“Havia um objetivo nosso de perseguir os pretos”.

“Me estimula e me desafia muito mais quando é anunciado um conceito do que se o diretor me falar: eu quero preto. De repente, eu estou resolvendo um problema com a fotografia a partir de uma frase abstrata, ou de uma recomendação, ou de uma lembrança. Antes do filme começar o Walter fez um texto sobre o perfil de cada departamento, desde o livro, a direção dos atores, sobre a fotografia ele diz assim:

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Vejo a fotografia árida e seca, como a geografia que cerca a casa dos Breves, áspera, em que uma parte do quadro sempre deverá estar às escuras. A presença constante da morte, mesmo de dia. Não há doçura, os rostos e os elementos do quadro são recortados, a escala cromática vai dos ocres ao negro denso, com alguns pontos de cor, principalmente o sangue, que deve ser de um vermelho vivo. A câmera não deve se revelar, não deve exibir-se e sim potencializar. A câmera objetiva é um quadro em que aquilo que deve ser visto convive sempre com aquilo que não se consegue ver, aquilo que se teme: a morte.Os personagens transitam da luz para a sombra, nela mergulham ou dela emergem“.

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O fotógrafo disse que vindo da direção um texto como esse dá segurança. Essa unidade no pensamento do diretor, a preocupação muito centrada no que ele quer fazer com aquilo, são muito importantes para o fotógrafo. “Mas na hora você tem que esquecer isto, é a hora lúdica do trabalho é a hora de se divertir com o equipamento, com as pessoas”.

Câmeras, lentes e negativos

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Abril Despedaçado foi filmado em Super-35mm com três câmeras: uma Aaton 35 III e uma Moviecam Compact, ambas da Videofilmes, e uma outra Moviecam trazida de Miami, que foi usada para os diálogos e as cenas de silêncio. Apenas um jogo de lentes Zeiss T2 foi usado para as três câmeras.

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As câmeras foram colocadas em situações e posições bastante incomuns que proporcionaram enquadramentos e movimentos de câmera surpreendentes e até mesmo únicos.

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“Eu acho que esse filme seria impossível fazer se não fosse Aaton, eu acho que a melhor invenção de todas as câmeras é a Aaton (…) as possibilidades que a gente desenvolveu de colocação de câmera nesse filme, não só no balanço, na bolandeira, como na mão. Aquela seqüência do cara correndo atrás do outro no meio da caatinga eu não poderia nunca correr naquela velocidade se não fosse uma câmera na mão”.

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Walter usou no total 800 latas dos negativos Kodak 5245 50D (I.E. 32) para as diurnas externas, 5246 250D (I.E. 200) para as diurnas internas e 5279 500T (I.E. 400) para as cenas noturnas. Os negativos foram revelados na Casablanca em São Paulo e o filme foi finalizado no laboratório Éclair em Paris:

“Meses antes fomos para a locação e o Walter trouxe um marcador de luz da França que ia cuidar do filme depois e nós fizemos muitos testes das três emulsões que eu usei. Aí eu fiquei na Bahia e ele levou os testes para revelar na Casablanca e na Éclair. As revelações ficaram iguais. Nós estabelecemos uma planilha de marcação de luz em todos os testes. Fizemos, então a revelação aqui na Casablanca e o filme foi finalizado lá na Éclair.”

Tudo flat

Perguntado sobre interferências na captação, como o uso de filtros, Walter disse: “Eu não mexo em nada, pra mim é tudo flat, se eu pudesse eu saía de casa flat, eu coloco um filtro na frente de uma lente e já fico angustiado, a não ser que seja necessário”. Ele usou apenas em 40% do filme o filtro 812 (Color Warming Filter) da Tiffen.

E mexer na obturação da câmera? “Não mexi, imagina você correndo no meio da caatinga com aqueles galhos secos na frente, com uma lente 100mm, 135mm, 200mm já dá um ‘strobe’ (efeito de flicagem na imagem), a ponto do Waltinho (Walter Salles, o diretor) que estava na outra câmera, achar que tinha perdido o ator, mas não, tava lá, só que não dava para ver. E eu tinha a mesma sensação, às vezes eu ficava catando o cara dentro do quadro e o cara tava lá no meio”.

No ponto da dificuldade

Sobre a relação com o diretor, Walter disse que com ele não havia indecisão, quando ele punha a câmera num determinado lugar ele sabia exatamente o que ia querer com aquele quadro. “Então, se eu dissesse é muita aérea pra iluminar e a gente ter qualidade nisso. Isso é o suficiente pra ele dizer assim: mas eu quero. E ele queria enquadrar a casa e a máquina de noite e queria que estivesse chovendo, e tinha 70 metros entre elas” e completou: “Aonde é possível chegar a resistência, também pode chegar a criação. Tem um plano que tem a bolandeira, a casa de rapadura e tem um caminho de chuva, 18 pontos de chuva, eu nunca fiz uma chuva tão grande, que a perna do último tripé da chuva está dentro do quadro e eu não podia fazer nada com aquilo, não podia mexer, porque era uma 25mm do pátio da fazenda, é um plano que não está no filme, mas ficou bonito, aliás eu gostaria de fazer um filme com os planos bonitos que não entraram”.

Segundo Walter um grande problema desse filme para a fotografia foi que eles filmavam de 20 a 30 planos durante o dia e entre 17h30 e 19h, quando o sol estava se pondo, faziam 50 planos. Ele contou que a sequência final em que o menino Pacú atravessa a casa, foi feita nove vezes, e foram nove tardes. Com a equipe toda já cansada por causa do dia todo debaixo do sol “chapante” é que se começava a trabalhar com duas câmeras, ventilador,etc A cada dia, eram necessários 89 km de carro para ir da pequena cidade onde a equipe dormia até a locação. A temperatura média era superior a 40º. “Por tudo isso, Abril Despedaçado foi um filme difícil de ser realizado. Mas sair fora daquele universo, ao término das filmagens foi ainda mais difícil”.

Ausência

Walter tinha como principais refletores de seu parque de luz: 06 HMI PAR de 1.2Kw, 04 Fresnéis de 4Kw e 02 Fresnéis de 6Kw. Segundo ele, em alguns momentos quase que não tinha nenhum, pois estava muito distante de tudo e às vezes era necessário outro refletor e pra chegar outro levava 72 horas no mínimo. Ele conta que teve momentos de tensão muito grande em que não sabia se na noite seguinte iria conseguir iluminar o pátio da fazenda “E eu optei por uma coisa muito simples, um pouco simples pra mim e um pouco complicado pra produção, mas que acabou sendo simples pra todo mundo. Eu coloquei os refletores lá em cima num guindaste de 28 metros de altura, e só fazia isso, eu não coloquei mais nada. Era um refletor pra cada coisa, o pátio, a bolandeira, a casa, com um CTO(gelatina de correção de cor) e um difusor. Era como se a luz estivesse vindo dos astros mesmo, uma coisa muito longe, chegava apagada, chegava ausente, e eu trabalhei com essa ausência o tempo inteiro”.

Venta muito na região e eles tiveram que literalmente “embrulhar” as gelatinas nos refletores suspensos a 28 metros de altura com arame e fitas para que a gelatina não soltasse com a força do vento. O eletricista só subia uma vez, direcionava o refletor e prendia. “O problema era quando estava tudo pronto pra rodar e um refletor apagava, aí tinha que descer tudo aquilo e começar do zero, aí eu fazia outra coisa, como um plano fechado”. Walter Carvalho disse que em geral essas filmagens eram feitas com duas câmeras, ele sempre em uma e o diretor Walter Salles na outra, para poder rodar dois planos a cada momento.

Pré-produção

Um ano antes das filmagens, Walter e o 1º assistente de câmera, Lula Carvalho, fizeram uma viagem de 4.000 Km pelo sertão nordestino começando na Bahia, e passando por Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará e Paraíba, em busca de uma bolandeira. Ele contou que no livro não é uma bolandeira, a fazenda dos Breves tinha uma outra atividade, mas o diretor Walter Salles assistiu a um documentário chamado “A bolandeira” de Wladimir Carvalho e disse “eu quero isso no filme, por que é a marca do tempo, eu vou fazer um filme sobre o tempo”.

“O Waltinho queria um sertão de Vidas Secas e acabei encontrando uma ruína de bolandeira e segui caminho procurando essas locações mais áridas que o Walter queria. No Ceará perto de Assaré, o Lula, que tava comigo, viu a fazenda que está no filme, alguma coisa o atraiu, ele focou encantado e começou a fotografá-la de tudo quanto é jeito. E aí o Cássio Amarante, diretor de arte, viu aquela fazenda e resolveu que seria a fazenda dos Breves e reproduziu a fazenda absolutamente igual por fora e o interior dela ele fez em função da decupagem do Walter (Salles).”

Walter Carvalho e seu filho Lula fizeram mais de 100 filmes fotográficos nessa viagem pelo sertão nordestino. Essa fase de pré-produção, em que o fotógrafo pesquisa as locações é fundamental para o filme, pois é nela que ele obtém informações valiosas que podem gerar novas idéias para a fotografia.

As imagens também foram muito importantes para a pesquisa do diretor de arte Cássio Amarante. Segundo ele, o material existente sobre o sertão é muito pequeno, pois é uma região muito pouco documentada. “Além disso, existem certos ‘cacoetes coloniais’ de que o sertão guarda muitas características coloniais, o que não é verdade”.

Os Copiões

“No Carandiru eu ia duas ou três vezes por semana no laboratório, eu revia os copiões, mas no sertão não dá pra você ficar achando cabelo em ovo, tem que acreditar que você tá fazendo corretamente. A maneira de expor, eu levei até as últimas conseqüências e te digo mais, às vezes a maneira de expor vírgula, o porque o foquista que o diga, nas noturnas ficava tudo aberto (o diafragma) tem foco aqui, não tem aqui. Eu tenho que acreditar mais na qualidade do negativo que a Kodak diz do que ela mesmo. De tanto você estudar, de tanto fazer, ver demonstrações, na hora de filmar não pode pensar nisso, na hora de filmar é a linguagem que manda minha cabeça“.

Walter contou que quando o marcador de luz foi até a locação fazer os testes, ele filmou um rosto perto da vela e mandou revelar para ver se teria muito grão. “O Waltinho aceita essas paradas”.