Por Lauro Escorel
O Segredo dos Diamantes
Um filme de Helvécio Ratton
Direção de Fotografia de Lauro Escorel
Produção: Quimera Filmes
1- O Segredo dos Diamantes conta a história de Ângelo, um adolescente de 14 anos que busca um tesouro do século 18 para salvar a vida de seu pai . Trata-se de um filme de “aventura e sentimentos”, nas palavras do diretor Helvécio Ratton (A Dança dos Bonecos , Menino Maluquinho , Batismo de Sangue), dirigido em especial ao público infanto-juvenil, mas com história capaz de atrair um público mais amplo. O filme é baseado em argumento original do próprio Helvécio a partir de lendas de Minas Gerais que se referem à tesouros desaparecidos da época do garimpo . O roteiro final foi escrito por Luís Bayão.
2 – Especificações técnicas:
Aspecto 1: 1.85
Captação Digital
Alexa Plus
Cooke S4
Snowflake
3 – Locações:
As filmagens, recém encerradas, foram realizadas ao longo de 6 semanas e meia. Nossa principal locação foi a cidade do Serro (330 Km de Belo Horizonte). A diversidade de cenários necessários nos levaram ainda a filmar em Milho Verde, São Gonçalo do Rio das Pedras, Guanhães, Sabará e Belo Horizonte .
4 – Elenco:
O menino Ângelo é interpretado pelo estreante Matheus Abreu. Na sua jornada, ele é acompanhado por dois amigos, Julia e Carlinhos, interpretados pelos também estreantes Rachel Pimentel e Alberto Gouvea .
O elenco conta ainda com os atores Rui Rezende, Dira Paes, Rodolfo Vaz, entre outros.
5 – Parceria e Amizade:
O Segredo dos Diamantes foi uma oportunidade de repetir a parceria com vários amigos. Além do reencontro com Helvécio, voltamos a trabalhar com Adrian Cooper na Direção de Arte e Marjorie Gueller no Figurino. A equipe de fotografia foi praticamente a mesma do Batismo de Sangue, com Fernanda Tanaka (Assistente de Fotografia), Ulisses Malta (Gaffer) e Renato Almeida, agora como chefe de maquinaria. Contamos ainda com o inestimável trabalho de Pepe Mendes, Rick Mello, Werick Dino, Marcão, Gilberto, Elcimar, Edu Gomes e mais a turma de ajudantes lá do Serro.
6 – Pontos de partida:
Ao visitar com Helvécio e Adrian a histórica cidade do Serro para conhecer nossas locações, fomos amadurecendo as ideias para a construção da narrativa visual do filme .
O ponto de partida foi considerar a cidade como “uma máquina do tempo” na qual nosso personagem mergulhava. Inicialmente apresentamos uma imagem próxima ao “Cartão Postal”, para em seguida revelar o que se esconde por trás da aparente tranquilidade das fachadas do vilarejo do século XVII. Buscamos construir um percurso narrativo de luz e câmera que tivesse um tratamento contemporâneo, seja nas cores, seja nos enquadramentos, e que articulasse o presente e o passado que ali se misturam. As ilustrações de Gustave Doré para a Divina Comédia de Dante também foram referências utilizadas para a construção da jornada dos três adolescentes tomados pela obsessão e necessidade de investigar o paradeiro dos diamantes desaparecidos.
7 – Instrumentos:
Para capturar estas imagens usamos pela primeira vez a câmera Alexa.
A captação foi feita através de cartão, em LOG C, Pro Res 444, que era até aquele momento a melhor alternativa de captação disponível no Brasil, quando pensamos em termos das dimensões da tela de cinema. Acredito que o material captado em RAW através do gravador externo tem uma resposta superior e, uma vez viabilizado este caminho entre nós, entraremos definitivamente na era da captação digital. Mesmo assim, a câmera me proporcionou uma experiência fotográfica das mais gratificantes.
8 – Testes:
Como de hábito, com equipamento novo ou tradicional, começamos por efetuar um teste fotográfico, simulando as diferentes situações do filme e conferindo a reação da câmera em cada uma delas.
Em seguida, o material foi descarregado no Pablo, onde fizemos uma análise dos resultados e exploramos o que poderia vir a ser o “look” do filme com o colorista Sergio Pascualino. Nosso teste incluiu ainda o transfer para película de trechos selecionados das diferentes imagens, já que, apesar do avanço da digitalização das nossas salas, ainda serão necessárias copias em 35 mm quando acontecer o lançamento do filme, no inicio do próximo ano.
As imagens projetadas permitiram constatar a fidelidade da reprodução das cores originais no processo e considerei a resposta positiva do ponto de vista da resolução. Partimos para Minas com a tranquilidade necessária para começarmos a filmar um longa metragem.
9 – Câmera:
Graças aos testes, a adaptação à nova câmera foi relativamente rápida.
Os primeiros resultados me confirmaram a generosa latitude do seu sensor e passei a trabalhar sem pensar muito no fato da captação ser digital. Apesar disso, admito que tentei, mas não consegui abandonar meus fotômetros velhos de guerra. Em parte pelo hábito, em parte por encontrar limitações nas informações fornecidas pelo seu verificador de exposição – False Color.
Me parece que o False Color indica um numero menor de steps/cores do que seria ideal. Não o vejo como representação plena da latitude do sensor.
Nem sempre os tons de cinza ali mostrados e sua interpretação nos dão noção exata dos meios tons existentes. Talvez pudessem fazer um segundo programa que traduzisse em tons de cinza a latitude real da imagem sendo captada. Lembrando que, se as condições de filmagem permitirem, o uso de um waveform para checagem dos níveis de luminância é sempre boa pedida.
Considero uma limitação só poder visualizar a imagem no viewfinder em LOG C ou REC 709. A imprecisão do grau de contraste visualizado me levava às vezes a perder tempo, voltando a conferir a leitura dos instrumentos. Estes problemas aparentam poder ser superados com a utilização do Arri look Creator e certamente desaparecem com o visor ótico da Alexa Studio.
Em relação ao índice de exposição, diria que apesar do índice nominal de 800 ASA ser verdadeiro, acho que a câmera melhora sensivelmente em termos de resolução quando trabalhada a 200 ASA.
Achei muito interessante a característica do sensor de trabalhar com a gama variável conforme o índice de exposição selecionado. Ao deslocar o centro da curva conforme o índice de exposição selecionado, amplia-se a latitude nas altas ou nas baixas luzes.
10 – Snowflake – Práticas Reencontradas:
O Snowflake é um laboratório digital móvel, que possibilita revelar, conferir e preparar de forma apropriada a imagem digital para a pós produção, no próprio local da filmagem. A revelação faz a checagem dos arquivos gravados e gera o backup do material bruto em fitas LTO4 ou LTO5. Em seguida, através da utilização do corretor de cores Resolve (Da Vinci) faz-se a correção de cores das imagens. O material é então convertido para o formato de edição (AVID ou Final CUT) escolhido pela finalização, em Full HD, com a primeira luz aplicada. Ao final do dia, a produção recebe um Hard Disk Multimídia com todo o material que foi filmado, com a primeira correção de cores, e TC aparente e em full HD. Tudo isso em velocidade superior ao tempo real da cena. Também é gerado um boletim de câmera digital que permite a visualização e anotações de qualquertake rodado. Cada take carrega suas respectivas informações, metadatas, e que pode ser impresso e funcionar da forma convencional.Vale também dizer que com ele podemos checar no set a composição de um chroma key, estabilizar uma imagem, e testar o básico de efeitos desejados.
O Snowflake me proporcionou a satisfação de resgatar praticas abandonadas nos nossos sets ao longo dos últimos anos.
Me refiro à possibilidade de visualizar de forma apropriada (em um monitor Apple, calibrado e com resolução superior a 2K) a imagem do filme ao longo do dia de filmagem. Através da utilização do Snowflake, conseguimos que cores, brilho e contraste da imagem sejam próximas do “look” projetado para nosso trabalho. Isto permite aprofundar o diálogo criativo com o Diretor, Diretor de Arte e Figurinista de forma a aprimorar os resultados ao longo do processo de filmagem. Nos últimos anos eu me ressentia pelo desaparecimento do “ritual” de assistir e comentar os “copiões (cópias de trabalho)”. OSnowflake resgata e aprimora aquela prática, ao permitir que façamos a revisão do nosso trabalho de forma fiel e “in loco”.
Opinião parecida tem o Helvécio:
“Nas filmagens de O Segredo dos Diamantes, primeiro filme que dirijo em HD, pude contar com o auxílio luxuoso de um Snowflake. Poucos minutos após terminarmos de rodar uma sequência, eu podia assistir no caminhão de câmera, em uma tela de bom tamanho e ótima definição, os planos já tratados pelo fotógrafo em termos de luz e cor. Ainda que não fosse a marcação final, os planos já apresentavam o primeiro esboço do que vai ser a “cara”, o visual do filme. E é com este tratamento de imagem que vou montar o filme, o que aumenta o prazer da montagem e acredito que interfira na própria percepção do tempo e da energia do plano. É o que vou experimentar agora quando começar a montar o filme. O Snowflake é uma bela ferramenta, dessas que a gente se pergunta como podia dirigir um filme sem ela”.
Ao longo da primeira semana foi estabelecida uma rotina que consistia em descarregar assim que possível o cartão com a primeira cena gravada, ajustá-la no Resolve com nossa colorista Julia Bisilliat. A partir desta primeira referência Julia ia “revelando” e aplicando a correção de cor nas cenas à medida que elas iam sendo descarregadas. Normalmente, Helvécio e eu conferíamos o material na hora do almoço e no final da diária. Isto permitia ajustes ainda ao longo do dia de filmagem e era com certeza para nós garantia de um bom sono.
Em um filme como este, todo filmado em locações, foram grandes os benefícios trazidos pelo Snowflake para a produção.
“A utilização do Snowflake traz segurança e agilidade na produção. Nos aproxima da imagem trazendo benefícios imediatos durante a filmagem, encurta o tempo de desprodução dos cenários e nos permite pensar na pós produção de imediato. Contar com este equipamento no set de filmagens de O Segredo dos Diamantes foi uma experiência enriquecedora e positiva. O filme tem efeitos previstos na pós produção e o equipamento nos permitiu ter a segurança necessária. Muito bom ter a possibilidade de ver que o caminho traçado é percorrido em um espaço muito, mas muito mais curto de tempo. Sair do set no último dia de filmagem levando as fitas LTO e HDs com todas as imagens do filme deu a sensação de que ali estava preservado o investimento de tempo e trabalho de toda equipe”.
Simone Magalhães Matos, produtora de O Segredo dos Diamantes
11 – Esclarecimento Final:
* Ao começar a escrever estas notas ponderei se seria razoável falar ainda em filmagem nestes tempos digitais.
A verdade é que durante o trabalho tentei usar – Gravar – e até mesmo – Hagadar (de colocar no HD), como me foi sugerido de brincadeira por um amigo. Ao longo do trabalho, alternei o uso de filmar ou gravar testando seu efeito em mim e nos outros. A medida que me familiarizava com a câmera e o trabalho avançava, fui me convencendo que o melhor termo para expressar o que eu fazia era mesmo – filmar – como maneira de valorizar todas as práticas e significados referentes ao ato de filmar.
Ainda em dúvida apelei para a Wikipédia, onde para minha alegria encontrei a seguinte definição:
“Filmagem é o ato de filmar, registrar imagens com impressão de movimento sobre um suporte cinematográfico, denominado filme ou película cinematográfica. E é também o processo de realização de um filme, produto audiovisual finalizado sobre este tipo de suporte. Por extensão, adotada mais recentemente, a palavra filmagem refere-se a todo ato de registrar imagens com impressão de movimento, assim como a todo processo de realização de produtos audiovisuais, independentemente da tecnologia utilizada”.
Ficamos então com “Notas de Filmagem” no título para este registro da nossa experiência de trabalho no set de O Segredo dos Diamantes. Agora é aguardar pela sua finalização e lançamento desejando que apreciem o filme pronto tanto quanto nós apreciamos as filmagens.
** – Ao escrever e compartilhar estas notas, quis aproveitar que a filmagem ainda estava fresca na memória e que isso incentivasse também aos colegas a mandarem para o site as suas “Notas de Filmagem”.
Fotos de Estevam Avellar, Renato Almeida e Bianca Aun.