Recomendação Técnica para Salas de Exibição Cinematográfica Parte 3

Cinema 20170216 00790
49º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. 7º dia de exibição dos últimos filmes da mostra competitiva.

Por Osvaldo Emery

A “Recomendação Técnica para Salas de Exibição Cinematográfica” é uma iniciativa conjunta da Associação Brasileira Cinematografia, ABC, e da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura, através do Centro Técnico Audiovisual, CTAv, e da Cinemateca Brasileira.

Ela tem por objetivo determinar as características arquitetônicas básicas para projeções com boa qualidade técnica e conforto do espectador de acordo com as características da mídia cinematográfica contemporânea e da fisiologia humana.

PARTE 3

3 ACÚSTICA DA SALA

A preocupação fundamental em termos de qualidade sonora de uma sala de exibição é fazer com o som nela reproduzido seja idêntico ao som que foi finalizado em uma sala de mixagem, na presença do diretor e do ‘sound designer’ do filme. Para que isso aconteça, a acústica da sala de projeção deve ser idêntica à acústica do estúdio de mixagem – ou vice-versa.

Neste aspecto, além dos parâmetros definidos por normas e recomendações técnicas, deve ser dada atenção ao recomendado pela ‘Dolby Laboratories’ que detém o virtual monopólio da produção e reprodução de som para cinema, seja analógico (Dolby SR) seja digital (Dolby SRD e Dolby EX).

Os aspectos mais relevantes para a qualidade acústica da sala de exibição são o nível de ruídos de fundo e o tempo de reverberação.

3.1 Nível de ruídos de fundo:

Para que a trilha do filme seja adequadamente percebida pelos espectadores, é importante que sejam eliminados da sala de exibição quaisquer sons indesejados, ou ruídos, que venham a se sobrepor aos sons da trilha e impossibilitar que eles sejam ouvidos. Além disso, é preciso considerar que o próprio silêncio, ou a ausência de sons na trilha, muitas vezes é utilizado para enfatizar uma cena ou seqüência; se o silêncio é perturbado por sons estranhos à trilha do filme, o efeito desejado pelo diretor se perde.

O nível de ruídos de fundo refere-se ao somatório das fontes sonoras de caráter ‘constante’ (steady-state) sem grandes variações em relação ao tempo em que acontecem. As principais fontes destes ruídos são o sistema de aquecimento, ventilação e ar condicionado, projetores, sistemas de exaustão de cabine e outros equipamentos elétricos e mecânicos instalados no prédio. Ruídos externos à sala não são considerados posto parte-se do princípio de que eles foram eliminados.

Quando da projeção com trilha sonora óptica analógica, se utilizava um certo nível de ruídos de fundo para mascarar o nível de ruídos inerente à esta tecnologia. No entanto, a progressiva redução de ruídos do som óptico foi reduzindo esta necessidade, culminando com a adoção do som digital que virtualmente eliminou os ruídos de fundo da mídia.

Com isso, o valor sugerido pela norma da ABNT, NC30, não é mais adequado, posto que quando de sua elaboração, no final da década de 1980 ainda não havia sido adotada a tecnologia de som digital para cinema e sequer tecnologias de redução de ruídos da pista de som óptica analógica como a Dolby SR.

Novos valores foram sugeridos por várias entidades, das quais as mais relevantes são:

a) ISO 9568, “Cinematography — Background acoustic noise levels in theatres, review rooms and dubbing rooms”, de 1993.

Esta norma propõe diferentes valores para o nível de ruídos de fundo, variando em função do perfil da sala:

Estúdios de som, salas de controle e salas para estréia (‘premier showings’) devem ter uma classificação (de nível de ruídos de fundo) mínima de NC-20 e máxima de NC-25.
Salas do circuito lançador de filmes (‘first-run theaters’) devem ter uma classificação máxima (de nível de ruídos de fundo) de NC-30
Salas que não seja do circuito de lançamento deve ter uma classificação máxima (de nível de ruídos de fundo) de NC-35.
Níveis (de ruídos de fundo) acima de NC-45 resultarão em uma reprodução de áudio de baixa qualidade.

A norma ISO também alerta para dois aspectos importantes:

Falta de ruídos na sala de projeção podem ser um problema tanto quanto seu excesso. Com excesso de ruídos, os detalhes se perdem, em casos extremos, a inteligibilidade fica comprometida. Com ruídos de menos, ruídos intrusivos intermitentes podem se tornar audíveis e irritantes; por conta disso, é recomendável utilizar um nível de ruídos de fundo razoável para mascarar as fontes de ruídos intrusivos.

Estúdios de som devem ser alertados para o fato de que se o nível de ruídos de fundo nos estúdios for muito abaixo do existente nas salas de projeção, sons de baixa intensidade que são audíveis no estúdio se tornarão inaudíveis na sala

b) “Technical Guidelines for Dolby Stereo Theatres”, novembro de 1994:

O nível de ruídos de fundo estável deve se situar, preferencialmente, abaixo de (os valores da curva) NC25, com (valores da curva) NC30 sendo o pior caso aceitável. Ruídos intermitentes não devem elevar o nível ruídos de fundo para valores acima de NC35.

c ) CST-RT-0012-P-2003, “Salles de spectacle cinématographique. Confort du Spectateur”, outubro de 2003:

Níveis de ruído de fundo máximos de NC 27, para reprodução com som digital, e NC 30 para som analógico.

Analisando-se as três recomendações acima, pode-se concluir que a norma ISO apresenta um complicador para sua aplicação por conta da definição de salas que não é utilizada no Brasil. Já a da CST é mais simples, porém limitada. Por conta disso, optou-se por definir limites de uma forma mais simples, combinando parâmetros da norma ISO e da recomendação da Dolby, ressalvando-se o tipo de projeto no qual será aplicada a Recomendação.

No caso de projetos para construção de novas salas, o parâmetro a ser utilizado deve ser o mais rigoroso: NC 25. No caso de projetos de reforma e/ou renovação de salas existentes, ou então de salas que utilizarão apenas som analógico, se aceitará um valor mais alto: NC 30. Foi definido também um piso mínimo para os ruídos de fundo, NC 20 e um teto máximo para sons intermitentes: NC 35.

Texto da Recomendação:
5.1 Nível de ruídos de fundo:
O nível de ruídos de fundo (NRFmax) no interior do auditório de salas novas e/ou com reprodução sonora digital deve corresponder aos valores da curva NC 25.

NRFmax = NC 25

Em salas existente e/ou com reprodução sonora analógica, o nível de ruídos de fundo máximo (NRFmax) aceitável será da ordem de NC 30.

Em ambos os casos, o nível de ruídos de fundo mínimo deve corresponder aos valores da curva NC 20. Ruídos intrusivos intermitentes não devem elevar o nível ruídos de fundo para valores maiores do que os da curva NC 35.

Curva Nc
GRÁFICO 1: Níveis de ruído de fundo: Curvas NC
3.2 Perda de transmissão entre salas adjacentes:

Este item é importante para garantir que no caso salas adjacentes, como acontece em conjuntos do tipo ‘multiplex’, o som mais alto produzido em uma sala não venha a interferir com o nível de ruído mais baixo que espera na sala ao lado.

Texto da Recomendação:
5.2 Perda de transmissão sonora entre salas adjacentes:
A perda de transmissão sonora mínima (PTmin) entre salas de projeção adjacentes deve igual ou, preferencialmente, superior aos valores da TABELA 1, para salas novas, com som digital com NRF igual a NC 20:

O texto é acompanhado pela tabela abaixo:

Tabela1
TABELA 1 – Perda de transmissão entre salas adjacentes
3.3 Tempo de reverberação:

O som digital trouxe mais canais sonoros para as trilhas dos filmes e, com isso, uma maior preocupação com a preservação da ‘imagem estéreo’, ou seja a capacidade do espectador em localizar espacialmente a fonte que está reproduzindo o som da trilha do filme. Em filmes com som Dolby Stereo EX estas fontes podem chegar a sete: frente-esquerda, frente-centro, frente-direita, ambiente-esquerda, ambiente-direita, ambiente-traseira, além do canal ‘subwoofer’ (freqüências muitos baixas, para sons muitos graves) que, este último, por suas características, não são localizáveis.

Os requisitos principais (mas não exclusivos) para garantir esta imagem são a redução do comprimento da sala em relação à largura da tela e, do ponto de vista da acústica, a redução do tempo de reverberação, que mede o tempo em que um som permanece em um ambiente depois de ser emitido pela fonte.

Neste item, optou-se pela utilização dos parâmetros recomendados pela Dolby, já que praticamente todos os filmes são produzidos utilizando-se tecnologia e os parâmetros definidos pela Dolby

Texto da recomendação:
5.3 Tempo de reverberação:
O tempo de reverberação no auditório na faixa de oitava com centro em 500Hz será determinado em função do volume de sala, de acordo com o GRÁFICO 1. O tempo de reverberação nas demais faixas de oitavas entre 31,5Hz e 16kHz deve variar de acordo com os limites definidos pelo GRÁFICO 2. Note-se que o GRÁFICO 2 apresenta fatores de multiplicação que deverão ser aplicados ao valor recomendado para o volume da sala na faixa de 500Hz.

Temp Reverb
GRÁFICO 2: Tempo de reverberação ( 500Hz) em função do volume da sala
Temp Reverb Fatormult
GRÁFICO 3: Fatores de correção para freqüências entre 31,5Hz e 16kHz

4 CONFORTO DO ESPECTADOR:

Garantidas condições para que o espectador perceba imagens e som com boa qualidade, é importante garantir também que ele isso aconteça em condições de conforto.

Além das questões de saúde e bem estar, as condições de conforto na sala de projeção são essenciais para a perfeita fruição do espetáculo cinematográfico. Pode-se considerar que o objetivo de uma boa projeção é fazer com que o espectador se esqueça de seu corpo físico e mergulhe totalmente na experiência sensorial que lhe é oferecida na sala. Para isso, devem ser evitadas quaisquer condições de desconforto que façam com que o espectador se lembre de seu corpo físico prejudicando sua imersão na realidade do filme.

4.1 Ângulos verticais da linha de visão:

Ângulos de linha de visão vertical excessivos provocam desconforto no espectador por obrigá-lo a manter a cabeça desconfortavelmente inclinada para cima durante a projeção. Este problema acontece com mais freqüência e intensidade nas primeiras fileiras de poltronas; sendo resolvido para estas fileiras, as demais automaticamente se adequarão ao parâmetro recomendado.

Em relação ao topo da tela (a)

Tabela2

Em relação ao topo da tela (ß)

Tabela3

Texto da Recomendação:
4.2.2 Os ângulos máximos de visão do espectador sentado na poltrona mais próxima da tela devem ser iguais ou, preferencialmente, inferiores a:
30 graus em relação a um plano horizontal (a) que passe pelo centro da altura da tela;
40 graus em relação a um plano horizontal (ß) que passe pela borda superior da tela.

4.2 Ângulo de inclinação das poltronas:

Este aspecto busca garantir que os espectadores não tenham que se virar o pescoço e/ou o torso excessivamente para o lado para que possam visualizar as imagens projetadas na tela.

Atender este parâmetro implica em inclinar as poltronas mais afastadas do eixo longitudinal da sala de exibição em direção ao centro da tela, até situá-las no limite aceitável. Geralmente, a solução mais adequada é a utilização de fileiras de poltronas dispostas em arcos concêntricos.
FONTE PARÂMETROS SUGERIDOS
ABNT O ângulo formado pelo eixo perpendicular ao plano do encosto e o eixo ao centro da tela, para cada poltrona, deve ser menor ou igual a 15º
AFNOR O ângulo máximo = 20º

Texto da Recomendação:
4.2.7 O ângulo formado pelo eixo perpendicular ao plano do encosto da poltrona e uma reta perpendicular ao centro da largura da tela, para cada poltrona, deve ser igual ou, preferencialmente, inferior a 15°. (FIGURA 4)

4.3 Espaçamento entre poltronas
Este aspecto visa garantir um espaçamento confortável para acomodação das pernas dos espectadores e facilitar o acesso às poltronas. Essas medidas pressupõem a utilização de poltronas convencionais de cinema, de boa qualidade, porém sem medidas exageradas; no caso disso acontecer, deverão ser feitas modificações.

Tabela4

Texto da Recomendação:
4.2.8 O espaçamento entre as poltronas, medido da face anterior de um determinado encosto até a face anterior do encosto imediatamente à frente (ou atrás) deve ser igual ou, preferencialmente, superior a 1,00m. (FIGURA 4)

Poltronas
FIGURA 4: Posicionamento das poltronas.
4.4 Conforto térmico:

Como existe uma norma específica para isso, a Recomendação se limita a mencioná-la.

Texto da Recomendação:
7 Condições de conforto térmico:
As condições de conforto térmico deverão obedecer aos parâmetros definidos pela norma NBR 6401, “Instalações centrais de ar condicionado para conforto – Parâmetros básicos de projeto”.

4.5 Acessibilidade:

Deve ser garantida facilidade de acesso a todos os espectadores, inclusive os com dificuldades de locomoção e usuários de cadeiras de rodas. Para isso, devem atendidas as recomendações de norma específica da ABNT.

Texto da Recomendação:
8 Acessibilidade:
O projeto da sala deverá atender aos parâmetros definidos pela norma NBR 9050, “Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos”.

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