Adrian Teijido, ABC e Ricardo Bardal: “Malasartes e o Duelo com a Morte”

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Por Danielle de Noronha

Pedro Malasartes (Jesuíta Barbosa) vive de pequenas trapaças e está sempre se safando das situações, mesmo as criadas por ele. Mas terá que enfrentar dois grandes inimigos: Próspero (Milhem Cortaz), que fará de tudo para impedir que sua irmã Áurea (Isis Valverde) namore um sujeito como ele, e a própria Morte encarnada (Julio Andrade), que quer tirar férias e enganar Malasartes. Ele ainda terá que lidar com a bruxa Parca Cortadeira (Vera Holtz) e Esculápio (Leandro Hassum), assistente da Morte. Agora, com personagens deste e do outro mundo se unindo contra ele, Malasartes terá que usar de toda a sua esperteza para sair ileso dessa confusão.

Se o ambiente rural em que vive o folclórico personagem Malasartes encanta pela beleza e simplicidade, o público vai se surpreender quando conhecer o mundo mágico onde reina a Morte no filme “Malasartes e o Duelo com a Morte”, dirigido por Paulo Morelli. Neste ambiente paralelo em que Malasartes se depara com a Morte, um universo fantástico, repleto de seres e paisagens irreais, foi construído digitalmente.

Para criar o universo de fantasia em que estes e outros personagens do filme habitam, a O2 Pós mobilizou um time de 100 artistas durante dois anos. Com orçamento total de R$9,5 milhões, sendo R$ 4,5 dedicados ao trabalho de pós, este é o filme com maior número de efeitos especiais do cinema brasileiro. O longa contabiliza 700 planos com efeitos especiais, o que corresponde a 50% de sua duração.

O diretor de fotografia Adrian Teijido, ABC e o supervisor de efeitos visuais da O2 Pós, Ricardo Bardal, falam sobre o trabalho no filme.

Quais foram as suas primeiras impressões ao ler o roteiro e como foram as primeiras reuniões com a direção e direção de arte?

Adrian Teijido: Li o roteiro e fiquei muito empolgado, pois nunca tinha participado de um filme desse gênero, entendi que se tratava de um filme fantasia e brasileiro ao mesmo tempo.

Com o Paulo Morelli e Tulé, diretor de arte, começamos a conceituar o filme entendendo as diferenças dos dois mundos, o real e o fantasia, onde moram a morte e as parcas. O Paulo estava com esse projeto há anos e já tinha conceitos muito definidos!

Já o Tulé trouxe referências, como parte do mundo fantástico que foi feito em 3D. Também tivemos a participação de um concept artist para começar a entender esse mundo.

Quais câmeras e lentes foram utilizadas para o projeto? Por que elas foram escolhidas?

A.T.: Por se tratar de um filme desse gênero, tive vontade de filmar com anamórficas, mas isto complicaria demais a pós. Acabei filmando com Cooke S4, enquadrando 1:2.35, e utilizamos uma Alexa Mini.

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Foram realizados testes prévios?

A.T.: Sim, fizemos uma série de testes conceituais e técnicos.

Filmei um dia nas locações rurais (mundo real), com sol e nublado, interior e exterior, levamos esse material ao colorista Luciano Santa Barbara , o Foca, e fizemos alguns luts para entender como trabalharíamos nessa área rural e também como procederíamos em caso de que o dia estivesse nublado.

Também fizemos teste de recorte no Chroma, para entender se seria possível trabalhar com uma tinta que não fosse a Rosco, pintamos um fundo metade Chroma Rosco e metade com uma tinta normal que simulasse o Chroma.

Ficou evidente que seria fundamental trabalhar com tinta Rosco, pois o recorte com a outra tinta deixava artefatos que tornaria inviável entrar na Rotoscopia, assim também como diminuiria muito a cor Spill.

Como foi o planejamento e o trabalho com a equipe de efeitos visuais e efeitos especiais?

Ricardo Bardal: Tudo começou com a leitura do roteiro junto com toda equipe, que englobou produção executiva, direção de arte, cenografia, fotografia, coordenação, direção e, claro, efeitos especiais em computação gráfica, que neste filme teve um diferencial pela quantidade de cenas e por ser essencial para a sua narrativa.

No caso especifico da computação gráfica, e depois de estabelecer no roteiro as cenas que realmente deveriam usar o cenário digital (feito no computador), dublês digitais (algumas cenas que não seriam possíveis se usássemos atores de verdade) e alguns efeitos de fumaça e brilho, tudo foi dividido em tarefas a serem executadas. Uma decupagem demorada com mais de 650 cenas que envolveu muita conversa entre a coordenação, supervisão e o diretor Paulo Morelli. Além disso, ainda tínhamos que levar em conta a dificuldade para encontrar as pessoas adequadas e dentro de um orçamento da realidade do mercado brasileiro.

Numa produção digital desse nível, as tarefas são muito parecidas com uma produção de verdade, no que se refere à construção do cenário. Em “Malasartes e o Duelo com a Morte” parte dos cenários foram realmente construídos e ficaram incríveis, o diretor de arte nos concedeu um vislumbre no set de filmagem e que para computação gráfica foi um desafio maior ainda, pois o nível da cenografia ficou fantástico, mas não era necessário fazer o cenário todo real, somente a parte onde os atores iriam atuar. Dessa forma, toda extensão do cenário seria computação gráfica e do mesmo modo que existe o marceneiro, pintor e o escultor, na computação gráfica temos o escultor digital, que fica a cargo de fazer os cenários digitais que, nesse caso, teve que ficar igual ao já construído no set de filmagem. O artista Alexandre Liki ficou encarregado da modelagem digital com sua equipe envolvendo alguns artistas de pintura digital. A próxima etapa é iluminar o cenário, que da mesma forma, temos que imitar a iluminação feita pelo diretor de fotografia. Todo o conceito que o diretor do filme e o diretor de fotografia chegaram para iluminar o cenário e dar a ambientação necessária para as cenas também são obedecidas na computação gráfica, novamente o que é feito no computador não pode ser percebido, pois estamos aumentando um cenário que já existe e deve parecer um cenário real assim como no set de filmagem.


A parte dos efeitos visuais, ou seja, aquilo que não existe na realidade, foi planejada até mesmo antes do filme ser rodado. Um profissional especifico de efeitos visuais, Michel Zigaib, eu e o diretor do filme, Paulo Morelli, fizemos uma única cena que não existia com o intuito de concretizar a ideia do diretor. Os fios da vida segurando uma vela seria a representação dos destinos de cada ser humano e estabelecer como isto seria feito ao longo de várias cenas foi crucial para o filme. Feito isso, e antes mesmo do filme, conseguimos fazer uma ferramenta digital para ser usada nas cenas do filme com as velas e os fios da vida.

Outra etapa interessante foram os atores digitais ou dublês digitais. Sabíamos que em algumas cenas seria necessária uma interação muito grande com os fios da vida e os atores, e ainda com um cenário todo feito no computador. Nesses shots, totalmente feitos usando computadores, os atores também foram digitais. O processo é semelhante a qualquer outro modelo feito digitalmente, mas, nesse caso, além do talento do artista, foi utilizado alguns recursos para auxiliá-lo. Através de várias fotos tiradas em vários ângulos dos atores em um ambiente adequado, e utilizando um software específico, é criada uma nuvem de pontos digitais que se assemelha muito ao ator de verdade. É a partir daí que a técnica do artista segue até o nível que essa nuvem de pontos se torne um modelo computacional adequado, dando continuidade a outro profissional que é o animador de personagem e posteriormente a um outro profissional responsável pela movimentação das roupas digitais, para ficarem mais realistas. Não trabalhamos com rostos ou expressões faciais nos dublês do filme “Malasartes”, pois envolveria muito mais tempo, mas de qualquer forma é uma novidade o modo que usamos quando comparado a filmes de longa-metragem feitos aqui no Brasil.

A parte final da equipe é a composição de imagens. Tudo que envolve a computação gráfica segue para ser composta e finalizada. Nesse filme não foi diferente, mas o volume de cenas e o nível de algumas sequências foram tantas que parecia ser uma operação sem fim. Realmente foi a maior equipe de composição para um filme aqui no Brasil, Saulo Silva foi o supervisor de composição e estabeleceu várias maneiras de dividir as tarefas. A novidade aqui realmente foi esse procedimento, pois todos os profissionais tinham um ótimo nível, mas a maneira de lidar com o volume gigantesco estabeleceu novos desafios nessa tarefa. Sem a união dessa equipe um filme dessa amplitude de efeitos não seria possível de finalizar.

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Os profissionais de pós estão cada vez mais presentes no set. Como você vê a transformação na relação entre esses profissionais e a fotografia?

R.B.: Ao meu ver o set se mistura muito com a computação gráfica. Um fotógrafo tem todo conhecimento técnico para estabelecer o que ele quer passar com uma imagem, a estética, a funcionalidade do enquadramento, e essa interpretação é parte do fotógrafo, ou seja, isto não depende estar com uma câmera em um set de filmagem ou ficar na frente de um computador. Entender que no computador as ferramentas de gerar imagens e os comandos técnicos já são muito próximos à realidade física, em relação ao comportamento de lentes e de luz, só irá ajudar o fotógrafo. Os conceitos não modificam muito em relação à arte do fotógrafo ou ao olhar do fotógrafo.

Em um ambiente controlado como um filme publicitário, ou fazer um filme de entretenimento, isso fica mais evidente, pois o planejamento das cenas simplifica e direciona o que será feito em computação gráfica, e o diretor de fotografia é uma pessoa presente e muito importante.

Existe já uma tecnologia que em sets de filme com orçamento elevado permite uso de equipamentos para visualização em tempo real de cenários e personagens digitais, mas ainda muito restrito a um mercado já bem desenvolvido e que tem demanda para esse tipo de tecnologia. Claro que o exemplo são filmes de bilheteria gigantesca, que justifica facilmente o uso dessa tecnologia, mas também é uma questão de tempo que esse desenvolvimento chegue a ser acessível a mercados menores, pois o uso de equipamentos de ponta reduz bastante os prazos, e reduzir o tempo de um filme encubado na computação gráfica é de grande interesse da indústria.

Teijido, e o que dizer do trabalho com o departamento de arte?

A.T.: Tulé fez um trabalho fantástico, a parceria foi fundamental para conceituarmos o mundo real e o fantástico. Resolvemos que no mundo fantástico não haveria dia ou noite, sempre seria um dia carregado de nuvens, frio, como se o sol houvesse acabado de se pôr.

Quais foram as principais referências para construir a fotografia do filme?

A.T.: O trabalho de pesquisa foi grande, vimos muitas ilustrações assim como filmes estilo Disney e filmes fantásticos, tipo Tim Burton.

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O que pode nos contar sobre as particularidades desse projeto?

A.T.: Não foi nada fácil, conceitual e tecnicamente, filmar com parte cenário e parte Chroma. Não é simples, pois os cuidados técnicos são imensos, a exposição do Chroma, cuidar no color Spill, que é o retorno do Chroma nos personagens e no cenário.

Outro desafio foi a transição do mundo real com o mundo fantástico, pois a transição começa quando ele sai do rio e entra na floresta, a partir daí filmamos um contra plano no Chroma com um pouco de plantas para simular a floresta e aí já estávamos no estúdio.

Como foi o workflow de pós e a sua participação nele?

A.T.: Minha participação foi principalmente no color e na supervisão dos DCPs, como tivemos muitas cenas com efeitos e com muitas pessoas trabalhando recebíamos essas cenas muito diferentes e foi muito trabalhoso dar um matching das cenas com efeitos para as cenas que não tinham efeitos, o Foca, colorista, fez um trabalho incrível.

O vídeo mostra o antes e o depois de algumas cenas, revelando processo de transformação por qual passam desde sua concepção, passando pela filmagem, com os atores atuando em fundo verde, até o resultado final

Ficha Técnica
Direção: Paulo Morelli
Produção: Andrea Barata Ribeiro, Paulo Morelli e Bel Berlinck
Produção Executiva: Wellington Pingo e Bel Berlinck
Produtor Associado: Fernando Meirelles
Roteiro: Paulo Morelli
Direção de Fotografia: Adrian Teijido, ABC
Direção de Arte: Tulé Peake, ABC
Diretor Geral de Pós-produção: Paulo Barcellos
Supervisor de VFX: Ricardo Bardal
Supervisor de Composição: Saulo Silva
Coordenador de Arte: Ton Ruey
Colorista: Luciano Santa Barbara
Coordenador de VFX: Diego Moreira
Diretora Comercial: Silvia Levy
Operador de Steady: Fabricio
Gaffer: Marcelo Oliveira
Maquinista: Guzulinha
Asistente de Câmera : Pimenta
Lead de Iluminação e Render: Gilmar Moraes
Produção de Elenco: Francisco Accioly
Montagem: Fernando Stutz
Música: Beto Villares
Figurino: Verônica Julian
Maquiagem: Anna Van Steen
Produção: O2 Filmes
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