Adriano Goldman, ASC, ABC: “The Crown”

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Por Danielle de Noronha

Com 10 episódios, a primeira temporada de “The Crown” estreou na Netflix no dia 4 de novembro. Escrita por Peter Morgan, roteirista de “A Rainha” (2006), a série é baseada em fatos reais e traz a história da família real do Reino Unido, em especial da Rainha Elizabeth II: o ponto de partida da série é seu o casamento com Philip Mountbatten, em 1947, antes de herdar a coroa, aos 25 anos de idade, após morte de seu pai, o rei George 6º.

Considerada a série mais cara da história, com orçamento estimado em US$ 130 milhões, “The Crown” tem recebido muitos elogios da crítica, tanto por sua história quanto por sua qualidade técnica. O diretor de fotografia Adriano Goldman, ASC, ABC, que assina a fotografia de seis episódios da primeira temporada e está filmando a segunda, conta um pouco sobre o trabalho na série.

Descreva câmeras, lentes, resolução e formato.

A primeira temporada da série foi filmada com Sony F55, antigas Cooke Panchros rehoused pela TLS/Londres.  A Netflix exige 95% em 4K. Aspect Ratio 2:1

Onde buscou referências para a fotografia do “The Crown”?

Eu diria que trabalho mais com anti-referências, ou seja, filmes, estilos e looks que não queremos revisitar. A definição do estilo acontece pouco a pouco, com pesquisa de material de arquivo e visitas às locações, reuniões criativas e muita conversa. Queríamos fugir do look “Cinderela”.

Como a fotografia foi pensada e trabalhou para levar a narrativa para o passado?

A intensão sempre foi revelar o lado mais pessoal da história, queríamos que os ambientes parecessem reais e tangíveis. A luz pretende ser realista, grandes janelas como fonte principal e luminárias para as noturnas. É um trabalho conjunto com a arte e o figurino, evitando cores saturadas e escolhendo objetos e mobiliário ‘com vida’.

O que essa série, em especial a fotografia, se diferencia das outras obras que já foram realizadas sobre a família real inglesa?

Não saberia dizer. Acho que nosso projeto oferece uma visão mais realista e mais próxima dos personagens, os ambientes são mais aconchegantes e menos formais.

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Como funciona a rotina de trabalho e quanto tempo para realizar cada episódio? Quantas páginas de roteiro são filmadas por dia?

O orçamento original tem 15 dias de filmagem por episódio planejados, mas filmamos bem mais do que isto com a segunda unidade somada. Teoricamente filmamos umas três páginas por dia, mas isso varia. A diária de filmagem é de 11 horas, mas pode ser de 9 horas se tivermos crianças.

Em muitas cenas parece que foi utilizado haze. Como foi isso?

Muito foi feito para dar um look mais cinematográfico para a série. As lentes, filtros glimmer glass e o haze ajudam a ‘driblar’ o fator 4K.

Como é o trabalho com a segunda unidade?

Temos uma segunda unidade que completa cenas que não pudemos terminar. Paisagens, planos de transição, detalhes e, às vezes, cenas inteiras, dependendo da disponibilidade do elenco.

O que dizer das locações e figurinos? Os cenários são locações reais ou adaptadas?

As locações são adaptadas. Não temos permissão para filmar no Palácio de Buckingham, mas não faltam locações em Londres, ou em regiões próximas, que passem pelas reais. Temos sets construídos em Elstree, que nos dão a parte mais reservada do Palácio, como quartos, closets e banheiros, por exemplo. Os figurinos dos personagens principais foram desenhados pela Michelle Clapman, baseados em pesquisa de época, mas não são exatamente cópias.

Como foi a relação com o outro diretor de fotografia da série? E em relação ao planejamento com ele e com os diretores e equipe de arte?

Olë Birkland filmou 4 episódios. Tivemos várias reuniões e fizemos vários testes para encontrar as lentes mais adequadas para a série. Os testes de luz e figurino ajudaram a estabelecer um LUT comum a todos. Ele se preparou especialmente para o episódio 4, aquele do smog. Na medida em que começamos a filmar ele nos visitou no set e fomos evoluindo o look e pudemos estabelecer algumas regras que valeriam para todos os episódios, mesmo guardando certas diferenças que foram bem-vindas. Inicialmente achamos que a série deveria parecer um filme de 10 horas, mas os diretores têm características e estilos de trabalho diferentes e essas diferenças tiveram que ser incorporadas.

Como é trabalhar com Stephen Daldry?

Escolhi fazer “The Crown” depois da ótima experiência que tive com o Daldry quando fizemos “Trash”, em 2013. Estou fazendo a segunda temporada pela parceria agora já estabelecida. Stephen tem uma história no teatro e sua coreografia é sempre extremamente complexa, cada cena é, em si, um pequeno filme. O set é muito dinâmico e ele sempre quer uma rica cobertura. “More is always more Adriano” é o que ele me diz com frequência. “Go for beauty, not for logic” é outra frase inspiradora. É um verdadeiro artista e o que ele extrai dos atores é incomparável. “Motion and emotion”.

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Como foi o workflow de pós e qual a sua participação nele?

Usamos PIX para checar o material filmado online. Eu recebo um Ipad que o DIT carrega com material recente.

Você participou do color grading? Como foi esse trabalho?

O color grading foi feito pelo Asa Shoul na Molinare London. Acompanhei todo o processo.

Quanto de pós-produção digital foi utilizada na série? Poderia indicar algumas cenas que contaram com pós digital e se estava previsto seu uso desde o início?

Os efeitos foram executados pela ONE OF US/London. Me lembro de como discutimos os efeitos para o episódio 5, a coroação. O desafio era misturar imagens de arquivo e o nosso. Escolhemos usar as câmeras da BBC que fizeram a filmagem na época como meio de transição e isso demandou muito planejamento. Story boards foram fundamentais.

O que o trabalho em “The Crow” representa na sua carreira? Quais as principais particularidades dessa série em relação a outras que tenha trabalhado?

A repercussão da série tem sido incrível mesmo. Deve ser o meu trabalho mais visto. Acho que entregamos um produto sofisticado e o retorno tem sido muito positivo. Acho que o orçamento permite trabalharmos em uma escala diferente, com uma infraestrutura muito sólida e pronta para encarar desafios artísticos e logísticos bem complexos. E é uma aula de história constante.

Algo mais que gostaria de acrescentar?

A série oferece um exemplo claro do privilégio que minha profissão me oferece, a oportunidade de trabalhar com diferentes diretores com diferentes personalidades e estilos, a oportunidade de servir e colaborar e ao mesmo tempo exercitar um poder criativo e de gerenciamento num projeto de longa duração em que um método pode ser desenvolvido e elaborado constantemente.

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