Ioseba Mirena: “Insight”

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Por Danielle de Noronha

Dividida em seis episódios, a série Insight acompanha a rotina de diferentes profissionais do design, adentrando em sua vida e em seus processos criativos. A cada episódio são exibidos os cotidianos dos protagonistas e através de depoimentos de outros profissionais, familiares, amigos e dos próprios designers, a série busca conhecer um pouco mais de quem está atrás de cada projeto. Sua próxima estreia está prevista para o dia 18 de dezembro no canal Arte1, às 20h30.

Entrevistamos o diretor e diretor de fotografia Ioseba Mirena sobre o trabalho na série.

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Como surgiu e se desenvolveu a ideia da série Insight?

No final de 2017, durante um comercial, acabei conhecendo o Leonardo Lattavo e Pedro Moog do estúdio de design Lattoog. Em poucas horas já tínhamos conseguido entrelaçar um ótimo relacionamento. Durante o almoço da filmagem o Leonardo me falou de sua vontade de realizar um documentário relacionado com o design brasileiro e seu processo criativo. Sendo totalmente sincero, inicialmente tratei de desencorajar ele da sua ideia (em essa época eu já previa das dificuldades que o audiovisual brasileiro ia sofrer com a chegada de um novo governo com perfil mais conservador). Expliquei que os custos são altos no meio do cinema, que praticamente a totalidade das produções eram realizadas com incentivo fiscal e que caso ganhássemos um edital geralmente demoriamos no mínimo dois anos para começar a produzir uma obra audiovisual. O Leonardo não se conformou e me solicitou a possibilidade de apresentar para ele em um período de duas semanas um projeto que eu achasse que teria um mínimo de chances de ser produzido.

Cheguei em casa, sentei junto com a Cassila Canoro, que é produtora do seriado, esposa e minha parceira de vida, e pensamos em diferentes maneiras de produzir o seriado com incentivo privado. Duas semanas depois marcamos uma reunião no estúdio da Lattoog junto com Leonardo, Pedro e um outro designer de renome do Brasil chamado Fernando Mendes. Eles adoraram a ideia, assim como o formato apresentado e decidiram entrar como coordenadores de produção dentro do projeto. Um mês após essa reunião, Jim Carbonera e eu já trabalhávamos nos roteiros; três meses depois estávamos filmando o primeiro episódio com a Julia Krantz em São Paulo e dez meses após desse primeiro encontro já estávamos apresentando o seriado totalmente finalizado para os canais de TV.

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Qual a estrutura da série e como foram escolhidos os personagens principais de cada episódio?

Cada episódio conta um pouco do processo criativo, assim como a vida de um arquiteto-designer ou estúdio de design do Brasil. Dentro da estrutura narrativa sempre mostramos cinco etapas: Apresentamos um marco especial dentro da vida de cada protagonista. Realizamos a apresentação do protagonista por meio de outros profissionais da mesma área. Motivo da sua obra, ponto de partida, de inflexão, de inspiração..; Apresentação da sua obra autoral. Finalmente terminamos de uma forma mais poética falando de seus sonhos, vitórias conquistadas, futuro, amizade.., focando no aspecto mais pessoal do criador. Como sou diretor e diretor de fotografia do seriado ao mesmo tempo, determinei que cada episódio deveria incluir momentos que envolvem a vida de cada protagonista.

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Eu queria humanizar o processo de criação deles. Meu desejo era alcançar o público em geral que não tinha conhecimento de design contando histórias humanas e escapar dos documentários tradicionais, que têm um foco muito elitizado e com público reduzido. Algo que me encheu de satisfação foi quando chegamos para gravar uma entrevista com Túlio Mariante no MAM do Rio de Janeiro. Estávamos filmando “Insight” por algumas semanas e estávamos absorvendo o design todos os dias. Um de nossos operadores de som começou a descrever perfeitamente a coleção de móveis à sua frente. Túlio Mariante, curador de design, ficou admirado ao ver como um técnico sem ensino superior conseguiu ter um rico conhecimento sobre o design brasileiro. Às vezes, o impacto desses programas não é apenas nos negócios, mas na vida real. Esse sempre foi meu objetivo principal, democratizar o mundo do design. Escolhemos personagens que conseguiram oferecer uma história de vida diferente. Julia Krantz é escultora, gravurista, marceneira, arquiteta.., é a arte misturada com a designer. Fernando Mendes é a cura interior mediante o design. Morito Ebine é o ensinamento do mestre, Lattoog é o sucesso de dois amigos que começaram um negócio como um simples hobby, NadaSeLeva é o desprendimento, Mameluca é a a mistura entre o design e a obra de arte.

O importante era oferecer uma temática diferente em cada episódio, mas tendo a temática do design de mobiliário como fundo do seriado. Nunca procurei os nomes mais importantes dentro do mundo do design e sim as pessoas mais interessantes.

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Por quanto tempo ela foi filmada e como era a rotina de produção?

Aproximadamente foram 7 semanas com filmagens diárias de aproximadamente 12 horas. Éramos uma equipe super reduzida, foi fisicamente muito duro, extenuante muitas vezes, mas nunca trabalhei com uma equipe com uma energia tão positiva. Acho que essa energia foi levada ao seriado por cada um dos integrantes da equipe.

Quais as referências e inspirações para a fotografia da série?

Desde o início me inspirei no seriado “Chef’s Table”, entendendo da dificuldade em realizar a produção com um orçamento que não chegava aos pés do “budget” norte-americano. Eu gosto de culinária, mas não sou nenhum pouco fã de programas tradicionais de cozinha, acho eles extremadamente entediantes. Parecem muito com os programas esportivos de mesa redonda com diferentes jornalistas, treinadores ou ex futebolistas falando de times diferentes; com a diferença que os programas tradicionais de culinária têm um apresentador ou cozinheira/o geralmente bonita/o, cozinhando em um cenário decorado. Acho estos programas um autêntico suplício. David Gelb quebrou esse formato careta em 2011 com “Jiro Dreams of Sushi” para depois começar a dirigir “Chef’s Table”. O seriado da Netflix não é um programa focado em culinária e sim no aspecto humano do protagonista. Você pode assistir um episódio de “Chef’s Table” e focar somente na história, a obra do autor é importante, mas o mais importante é quem está atrás da própria obra. As pessoas se apaixonam pelas pessoas.

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Com quais foram as câmeras e lentes utilizadas? Por que elas foram escolhidas?

Filmamos o seriado com uma Red Dragon. É uma câmera que pode ser inferior em performance em alguns aspetos a uma Alexa ou Sony Venice, mas também oferece muitas vantagens. A Dragon é uma câmera muito utilizada nas séries de documentários realizadas nos Estados Unidos, exemplo “Chef’s Table”, “Wild wild country” etc. É uma câmera extremamente versátil, mas tem que conhecer muito bem cada aspecto dela, seus pontos fracos e positivos. Escolhi ela por dois motivos principais. Primeiro porque ela oferece HDR. Ao ser uma produção com investimento muito limitado, a equipe não tinha muitas vezes tempo de escolher o momento mais adequado de realizar uma filmagem externa. O HDR foi fundamental em esse aspecto, já que ao ser um documentário focado na maioria das ocasiões em planos em movimento, em muitas ocasiões não existia uma planificação prévia de filmagem nas quais você poderia controlar os highlights.

Outro aspecto determinante foi o poder de resolução da câmera. Naturalmente o fotógrafo sempre vai dar prioridade na faixa dinâmica, mas ao filmar o seriado com uma única câmera, tínhamos que ter a chance de oferecer para o montador o uso de diferentes planos que foram utilizados em forma de cropamento de imagem. Outro dado que estudamos com atenção devido a enorme data que iríamos captar foi a data rate de cada codec. Exemplo um arquivo em 4K em Prores 4444XQ é bem mais pesado que um arquivo R3D em 6KWS (4:1), um ProRes em 422XQ é quase seis vezes mais pesado que um arquivo R3D em 4K FF (6:1) e um ProRes 422 simples quase quatro vezes mais pesado que um R3D 4K. Nem falo da Arri Raw porque é ainda mais pesada que a um ProRes 4444XQ. Na época não tínhamos nenhuma Sony Venice no Brasil. Realmente a Venice é a câmera com o codec mais leve atualmente, o X-OCN que oferece igual ao arquivo R3D uma codificação linear de cena de 16 bits. As pessoas que não têm conhecimento técnico acreditam que maior resolução significa automaticamente maior data criada sem saber que os diferentes codecs representam realmente a diferença do “peso” real do material filmado. Na época, por causa desses aspectos, escolhemos filmar com a Red Dragon.

Em relação à ótica utilizada, o importante para mim era que o “Insight” tivesse uma aparência elegante e dar muita importância à fotografia apesar de ser um documentário. Muito disso remete a uma decisão tomada de deixar para trás a ferramenta favorita de um documentarista – a lente zoom – e filmar a série usando apenas lentes prime. As lentes prime não são muito convenientes porque você não pode alterar o tamanho da imagem sem se aproximar ou afastar-se do objeto. Mas queríamos tentar manter o visual mais bonito e sofisticado do programa, realmente fazer parecer um filme. Trabalhamos com um kit de lentes de CP.2, que é uma lente relativamente “barata”, mas de preço-qualidade justa. Caso tivéssemos um orçamento maior, poderíamos ter escolhido outro kit de lentes mais sofisticado, mas ao ser uma série de documentário as CP.2 conseguiram realizar o trabalho sem problema nenhum.

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Esta primeira temporada foca no design de mobiliário. Há planos para as próximas temporadas? Quais serão os possíveis temas?

A Nonno Filmes, que é a produtora responsável pelo seriado, já está no processo de captação para realizar a 2ª Temporada que será uma surpresa. “Insight” é uma série que irá abranger as mais variadas áreas do universo criativo (design de interiores, moda, arquitetura, jóias…), com um pouco de sorte e muito trabalho, teremos mais temporadas. Os canais que licenciaram a 1ª temporada já mostraram seu interesse em manter a parceria para as próximas temporadas.

Como foi o workflow de pós e sua participação nele?

A maior parte do material captado foi em 6K, em color space de RedColor2, que acredito que seja a mais neutra para o tom de pele e em RedLogFilm no espaço do gamma da câmera. O OLPF utilizado foi o standard que na minha opinião depois de muito tempo a RED finalmente ofereceu um filtro interno que acabava com antigos problemas de aberração cromática. Todo esse set up prévio é importante para entregar o material para o colorista depois. Na hora da colorização, o Ari Marins da Punch Filmes colocou uma primeira base de lut de Rec709 chamado RedLogFilm-V2-LTR fixo para todo material montado. Realizamos testes prévios e realmente foi uma base que funcionou muito bem com o material captado.

Naturalmente depois foram realizados ajustes acima dessa base preliminar. Hoje em dia a maioria das filmagens com câmeras RED é realizada com material totalmente captado em HDR e com color space REC2020, mas na época não tínhamos um monitor adequado para trabalhar em 2020 e escolhemos trabalhar em 709. Sempre estou presente na colorização, é um processo muito enriquecedor. A montagem do trailer do seriado foi realizada pelo meu grande camarada Leandro Rial e a montagem de cada episódio foi realizada por mim. A filmagem de uma série de documentário de baixo orçamento tem muito disso, acaba acumulando trabalho em uma mesma pessoa.

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Além do Arte 1, em quais outros espaços a série será exibida?

Tv5Monde, BoxPrime, Fashion TV e estamos ainda em negociação com outro canal para exibir o seriado em 2020. Ao ser um seriado produzido com investimento privado sem incentivo econômico de nenhum canal ou incentivo federal, não ficamos obrigados a exibir o seriado em um único veículo. Isso realmente é uma grande vantagem para a divulgação do seriado. O seriado também foi exibido em outubro no Anteo Palazzo del Cinema em Milão, durante o festival de cinema do MDFF.

Como você tem percebido o mercado de séries documentais no Brasil?

O público geral no Brasil não é grande consumidor de documentários, é muito difícil ver um documentário ser exibido em uma sala de cinema. Atualmente tem uma forte aposta de conteúdo próprio da Netflix, mas geralmente são produções realizadas no exterior. Apesar disso é gratificante ver produções nacionais da Netflix que deram certo como o documentário “Democracia em vertigem” ou a série de documentários “Guerras do Brasil”. Acredito que a cota de tela deveria ser incluída para os canais de streaming, mas o lobby é muito forte e com certeza isso não vai acontecer.

O problema na minha opinião com a produção nacional de documentários é que eles não são realizados para ser assistidos e sim para ser somente produzidos. São produzidos muitos documentários, mas poucos são assistidos. Existe um fomento federal em produzir os filmes, mas não existe o mesmo volume de ajudas para que eles sejam distribuídos ou licenciados. Os canais geralmente licenciam conteúdo que eles mesmo produzem, o lucro fica na produção e o licenciamento ou distribuição em realidade gera um custo sem retorno. Não existe uma tabela de valores de licenciamento no país,  por isso os canais têm um orçamento anual muito reduzido e acabam pagando valores baixos para os licenciamentos, em muitas ocasiões de R$25-R$100 o minuto exibido. É difícil um canal de tv licenciar uma obra que não tinha sido produzida por eles mesmos.

Acredito que teria que ter maior fomento na distribuição das obras produzidas para dessa maneira começar a educar um público que não tem cultura de assistir documentários, mas realmente vendo a situação atual do mercado audiovisual, acredito que cada vez mais tenhamos que pensar em produzir as obras audiovisuais com um modelo de negócios diferente do que estávamos acostumados a realizar. Já tivemos este ano um corte de quase 43% do orçamento do FSA. A Nonno Filmes já se adiantou a estos possíveis problemas com “Insight” e procurou o caminho do setor privado. Mas ainda assim, tem que mudar a cabeça do empresariado, eles têm que acreditar muito mais no potencial do setor do audiovisual que com certeza é o formador de opinião mais poderoso do mercado.

Algo mais que gostaria de acrescentar?

Não. Com certeza um dos meus defeitos é falar demais.

Ficha Técnica:
Diretor: Jose de Aiete
Produtora executiva: Cassi Canoro
Cinematografia: Ioseba Mirena
Roteiro: Jim Carbonera + Jose de Aiete
Coordenadores de produção: Leonardo Lattavo e Fernando Mendes
Editor: Jose de Aiete
Assistente de câmera: Ruan Carlo Amaral Monteiro
Técnico de som: Levi Brat
Mixagem e Sound Design: Rodrigo Rezende
Colorização: Ari Marins e Nonno

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