Otavio Pupo: “Sobre Rodas”

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Por Danielle de Noronha

Eleito o Melhor filme pelo público no TIFF Kids (Canadá), melhor filme no Chicago International Children’s Film Festival (EUA) e Melhor Filme da Mostra Geração, no Festival do Rio, Sobre Rodas estreia hoje, 14, em salas de cinema de diversas cidades do país.

O filme conta a história de Lucas (Cauã Martins), de 13 anos, que volta à escola depois de um acidente que o colocou em uma cadeira de rodas. Lá, ele conhece Laís, (Lara Boldorini), também com 13 anos, e juntos partem por estradas de terra interioranas, em busca do pai que a menina não conheceu.

Entrevistamos o diretor de fotografia Otavio Pupo, que conta sobre a fotografia da obra.

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Como surgiu o convite para participar do Sobre Rodas?

Tinha realizado com o diretor Mauro D’Addio o curta metragem “O Morro da Guerra Eterna”, filme também voltado para o público infantojuvenil, a experiência desse set de filmagem deu início a nossa parceria. Realizamos diversos projetos após o curta e o convite para realizar a Direção de Fotografia do Sobre Rodas surgiu em setembro de 2015.

Quais foram as referências para a fotografia do filme?

Busquei me inspirar não só em road movies, mas também fui à procura de filmes independentes em que o desenho de luz e o trabalho das cores me agradava. Depois de bastante pesquisa, quatro filmes formaram uma base estética: “História Real” de David Lynch, “À Beira do Caminho” de Breno Silveira, “O Garoto da Bicicleta” dos irmãos Dardenne e “Tudo Sobre Vincent” de Thomas Salvador.

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Quais as câmeras e lentes foram utilizadas no projeto e por que você as escolheu?

A câmera utilizada no projeto foi a Sony Fs7 mk1 com as lentes Cooke Panchro T2,8. Escolhi a Sony Fs7 por conseguir filmar o filme inteiro no ISO 2000 com baixa relação sinal-ruído. Dessa maneira, eu não precisei montar grandes set ups de luz e consegui entregar os planos de uma maneira mais ágil em nosso cronograma apertado de 15 diárias. A escolha das lentes Cooke Panchro foi principalmente pela excelente transição de tons de pele que a ótica da Cooke produz. Além das lentes cooke panchro, usei sempre um filtro pro-mist 1/8 para suavizar ainda mais a imagem.

Como foi pensada a luz do filme?

Como tínhamos um sensor com ISO 2000 nas mãos, eu e o Gaffer Denner Clemente sempre pensamos em iluminar da maneira mais simples, verosímil e naturalista possível. Nas visitas de locação, fiz várias fotos com a luz disponível das locações e, a partir dali, conversávamos como deveríamos proceder caso a caso. Para as internas das casas dos dois personagens, trouxemos para o filme dois refletores antigos de vapor de sódio, quando a luz desceu do caminhão ela tinha bastante pó, mas o resultado foi excelente. A cena final da festa junina eu usei só um refletor de contraluz, o restante da cena foi iluminado com as luzes diegéticas.

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Em qual cidade o Sobre Rodas foi filmado e como foi o processo de escolha das locações?

“Sobre Rodas” foi rodado na cidade de Monte Alegre do Sul, que fica aproximadamente 130 km de São Paulo, próxima de Serra Negra e Amparo. O processo de escolha de locação foi um trabalho intenso realizado pela produção de locação. A busca foi por cidades próximas a São Paulo, no máximo a duas horas e meia de distância, para os deslocamentos de equipe e eventuais emergências de produção. Monte Alegre do Sul foi uma escolha muito certeira na minha opinião. A cidade tem menos de 10 mil habitantes, é bem tranquila e a população local nos recebeu muito bem, ajudando sempre que possível. Além disso, ela fica em um vale e o recorte do sol nas horas mágicas é bem bonito.

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Muitas das cenas do filme foram realizadas em movimento, em estradas, inclusive com tomadas aéreas. Poderia nos contar um pouco sobre a filmagem dessas cenas?

Desde o início, o Mauro me disse que uma das maneiras do espectador se conectar com a história e os protagonistas era adicionando bastante movimento nas cenas de estrada. Então, fizemos o máximo para que esses movimentos ajudassem o espectador a entrar na jornada junto com os nossos personagens. Muitas vezes um plano com movimento bem realizado vale por 5 ou 6 posições de câmera parada. Meu plano favorito do filme é um travelling logo após a queda da Taís na estrada de terra, ela levanta a bicicleta e ensaia um “rompimento” com o Lucas. Ali eu acho que a gente foi muito feliz na escolha da lente 25mm e com o movimento super sutil. Os atores ficaram sempre um em cada extremo do quadro durante a “briga” e depois ficam centralizados ao continuar a viagem.

Além desse tipo de movimento, decidimos usar o drone também como ferramenta para ajudar a contar a história. Filmamos todas as cenas aéreas em uma única diária: a última. Quando assisto ao filme, fico impressionado como essa diária rendeu! Quase todos os planos que gravamos estão no corte final do filme.

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Como foi o diálogo da fotografia com a direção e equipe de arte?

Por mais que “Sobre Rodas” tenha sido um projeto independente, fiz o máximo de pré-produção que pude, justamente para alinhar todo o projeto estético com a Direção e a Direção de Arte. Quando entrei de cabeça na pré, o Mauro e a Fernanda Carlucci, diretora de arte, já tinham um projeto e uma ideia muito clara de look para o filme, que fosse vivo, colorido e, ao mesmo tempo, naturalista.  O que eu fiz foi contribuir com referências adicionais e adequar o projeto deles às características específicas de cada locação e à decupagem também. Muitas locações eram bem apertadas, como a casa da família da Taís e da Dona Pereira, eu e a Microfonista Andressa Clain tínhamos que fazer verdadeiras acrobacias para conseguir os planos. Dois deles que gosto muito são planos que montamos um trilho no teto na casa da personagem da Dona Pereira com a câmera apontada 90º.

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O filme recebeu diversos prêmios em festivais voltados para o público infantojuvenil. Na sua opinião, qual a importância do audiovisual brasileiro construir narrativas que dialoguem com esse público?

O filme foi exibido nos principais festivais do Brasil, eleito melhor filme pelo júri da Mostra Geração do Festival do Rio e fora do Brasil passou em diversos festivais também, ganhando o prêmio de melhor filme do júri popular no TIFF KIDS – Festival de Toronto e pelo júri no Chicago International Children’s Film Festival.  Fico muito feliz com a carreira que o filme teve e espero que ele alcance cada vez mais público. Acredito que o público infantojuvenil é importantíssimo para a longevidade do cinema brasileiro. Crianças e Pré-Adolescentes têm uma percepção e relação com o audiovisual totalmente diferente de nós, adultos, e captam sutilezas que muitas vezes nós não percebemos. Devemos valorizar essa diferença produzindo cada vez mais conteúdos destinados à essa faixa etária. Muitas vezes no próprio set de filmagem eu fiquei impressionado com a dedicação e concentração de todo elenco mirim, mas, em especial, os dois protagonistas Cauã Martins e Lara Boldorini, com certeza a atuação deles me inspirou muito.

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Como foi o workflow de pós e qual a sua participação nele?

Nosso Workflow de set-pós foi desenvolvido em parceria com a Clandestino e com o colorista chefe Alexandre Cristófaro. Fizemos alguns testes comparativos entre o 4k interno da câmera 4:2:0 e o 2K 4:2:2 via gravador externo. Optamos por gravar em 2K e ter mais espaço de cor para a pós-produção. Desenvolvemos um LUT também baseado nas referências e valores tonais que estávamos buscando. Depois que a nossa montadora Silvia Hayashi chegou ao corte final, sentamos por uma semana e fizemos a correção de cor. Fiquei bem feliz com o resultado. Da mesma maneira que eu trabalhei no set, fiz o máximo para a correção de cor ser sutil, sem um grade muito pesado.

Algo mais que gostaria de acrescentar?

Aproveito a oportunidade para parabenizar toda a Equipe da Klaxon Cultura Audiovisual, da Hora Mágica Filmes e toda a equipe e elenco do filme que ajudaram a dar vida a esse projeto tão especial, que depois de ser lançado comercialmente na Bélgica e Romênia chega ao circuito brasileiro.

Ficha técnica:
Direção e Roteiro: Mauro D`Addio
Produção: Beatriz Carvalho, Mauro D`Addio e Rafael Sampaio
Produção executiva: Beatriz Carvalho
Direção de Fotografia: Otavio Pupo
Montagem: Silvia Hayashi
Direção de Arte: Fernanda Carlucci
Colorista: Alexandre Cristófaro
Música Original: Lucas Marcier e Fabiano Krieger
Desenho de Som: Rafael Benvenuti
Preparação de Elenco: Ariela Goldmann
Produção de Elenco: Rafael Aidar e Ingrid Souza
Som Direto: Fred França
Direção de Produção: Madan Almeida
Produção de Set e Frente: Eduardo Basile
1˚ Assistente de Direção: Wally Araújo
Maquiagem: Marcos Freire
Figurino: André Simonetti
Produção de Objetos: Mario Surcan
Consultoria de Roteiro: Marcelo Starobinas
Vfx: Ricardo Kodó
Motion: Renato Batata
Animação dos créditos: Claire Cuinier
Fotos: Bella Tozini
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