Entrevista com Romeu Quinto, ABC

Romeuquinto

Por Danielle de Noronha

Leia a entrevista realizada com o técnico de som Romeu Quinto.

Como você entrou para o cinema e qual foi o seu primeiro longa?

Eu comecei neste meio praticamente quando eu nasci, porque eu nasci dentro dos corredores da TV Tupi, que foi o primeiro canal de televisão montado no país. O meu pai foi engenheiro responsável pelo som. Todos os meus tios, que são 4 homens irmãos do meu pai, cada um é especialista em uma modalidade de som. Eu aprendi quando criança todos os fenômenos físicos e estava sempre com eles. Com 16 anos eu já estava na ODIL FONO BRASIL trabalhando na pós-produção de áudio de cinema.

Então você pegou muitas coisas do cinema brasileiro?

Peguei quase todo mundo. Trabalhei com o Mazzaropi, Rogério Sganzerla….

Qual foi o primeiro longa que você trabalhou?

Eu acho que foi o longa do Alan Fresnot que a gente fez na faculdade chamado “Trem Fantasma”. Sem ser na faculdade chama-se “Som Alucinante”, que é um longa-metragem que é Woodstock brasileiro. É um longa-metragem que foi feito em cima do Woodstock Brasileiro, que foi um show de rock que durou vários dias. Esse foi o primeiro comercial que eu ganhei dinheiro e não era só eu, tinha mais três técnicos de som.

Como você avalia o cenário do cinema brasileiro hoje?

Eu acho que ele continua paternalista e só vai deixar de ser assim quando os orçamentos forem acima de 100 milhões de reais. É um cinema de autoria, são projetos grandes e a gente precisa ter muita criatividade para poder superar os percalços que a gente tem. Mas está muito melhor do que estava há 10 anos trás. Agora é uma das primeiras vezes que eu vejo que o ciclo bom é um pouco mais longo.

Como você fazia nesses ciclos? O Collor chegou, parou…

Eu comecei a diversificar muito cedo, pois eu já percebi logo de cara que era uma coisa que tinha ciclos muito grandes negativos. Eu tenho outras atividades paralelas ao cinema. Hoje em dia cinema é o meu suporte. Eu ganho dinheiro com cinema hoje. As coisas paralelas são secundárias, mas já foram primarias em algum momento.

O quê você acha que se tem que fazer para que o público vá ao cinema?

O cinema passa a ser cinema quanto o público vê, enquanto ele não ver, é só filme. Eu acho que o atrativo que vai levar mais público ao cinema é em primeiro lugar ter mais salas, baixar os valores para que o nosso povo tenha mais acesso. Tem que popularizar mais, ter co-produções com as televisões, pois já vimos que nos países desenvolvidos isso funciona muito bem e ter que deixar de ser paternalista e ser mais industrial, aí ele vai atingir todo o público.

Na sua área quais são os principais desafios encontrados?

Primeiro eu acho que é a ignorância com respeito ao que é o som, esse é o primeiro obstáculo. São poucos os diretores que têm consciência do que é o som. A gente sabe que o som é mais uma ferramenta na linguagem cinematográfica e muito importante. É audiovisual e antes você fala áudio e depois visual. Hoje o cinema já usa o som como forma de espetáculo a partir de Spielberg , que começou os grandes projetos de modernização do som no cinema. Então o espetáculo sonoro torna-se grandioso. É muito diferente um filme com o áudio exuberante, do que uma coisa modesta, fraquinha… e os nossos filmes a maioria é modesto, fraquinho, pois a gente não tem dinheiro, quando chega na hora da finalização o dinheiro já acabou.

Eu acho que outra dificuldade que tem são as características sonoras. O nosso país é muito barulhento, as normas não são respeitadas. Então os carros são muito barulhentos, as casas não têm acústica. O nosso país tem uma característica sonora bastante “suja” e isso é uma dificuldade. Mas ao mesmo tempo, você tem projetos que podem incorporar isso e aí passam a ser elementos de linguagem. Mas quando não dá para incorporar isso é uma das maiores dificuldades que a gente tem.

Se tivesse mais dinheiro essa realidade poderia ser diferente?

É difícil de responder, vou tentar responder apresentando 3 pontos de vista. O primeiro é de quem está começando: é muito difícil, os equipamentos são muitos caros e paga-se muito mal. É muito difícil, a não ser que você tenha uma família muito abastada e aí você pode comprar equipamento. Por outro lado, eu já estou em uma posição em que eu tenho o melhor equipamento que tem. Se não tivéssemos os impostos de importação os aparelhos seriam mais baratos. Os impostos são absurdos, com 60, 70% colocados em cima do preço e não tem nenhum tipo de aparelho similar no país. Eu já atingi um ponto de equipamento que estou muito bem, que dá para responder a qualquer tipo de projeto daqui ou da América latina. Mas eu não posso assumir um projeto americano de grande porte, por exemplo, sem ter que alugar ou compra equipamento.

São os três pilares do cinema, grana, organização e criatividade.. Tudo é muito caro e especifico no cinema, como equipamentos. Manter este equipamento também é muito caro.

Como está a formação do profissional de áudio no país nos dias de hoje?

Acho que mudou muito, hoje tem disponível em SP e RJ cursos técnicos de captação e pós-produção de áudio e muito mais oportunidade para os que estão iniciando.

O que mudou para o áudio com esses avanços da tecnologia durante a realização e a exibição?
Mudou tanto que hoje já é possível gravar som ambiente em 5.1 no set que vai te dar na sala de cinema a exata noção de espaço, dimensionando-o, dependendo de onde o espectador sentar.

Você participa do processo de montagem?

Não. To pensando em retomar isso novamente na minha vida, que antes eu fazia muito. Quando entrou a era da informática, eu passei a trabalhar só no set. mesmo por que, a oferta de trabalho foi tão grande que eu não tinha mais tempo de ficar pós-produzindo os trabalhos que eu fazia. Mas eu acho que já estou maduro e acho legal retomar esse trabalho. Acho importante inclusive. Isso melhoraria o meu trabalho, pois eu tenho consciência do trabalho, das dificuldades e por mais que converse com a pessoa que vai fazer a pós-produção não é a mesma coisa.

Como você considera a cobertura da imprensa no cinema brasileiro?

Agora ta bem melhor. É lógico que tem os felizardos, os apadrinhados e os desapadrinhados. Para os apadrinhados está bem melhor do que antes. Não é a mesma coisa. Continuamos falando do paternalismo que é a falta de dinheiro. A mídia é muito dinheiro, as vezes mais até do que o que foi investido no filme; para se ter uma boa exposição; poder vender o seu filme. Já melhoramos muito, mas ainda há muito para melhorar.

Você não acha que a imprensa poderia vir aqui buscar o cinema brasileiro?

Isso depende muito da produção. Se a produção tiver uma assessoria de imprensa sempre tem televisão, jornal no set. isso é claro e é muito importante. Quem faz isso, já tem consciência de com é que funciona e já está investindo na mídia enquanto o projeto está se desenvolvendo. É por isso que custa mais caro do que fazer o filme. O filme é apenas um filme dentro de um plano de mídia.

Algo mais para acrescentar sobre a profissão?

Acho também que falta SIMANCOL nos aspirantes a direção do som, pois o cara faz duas assistências e já se acha capaz de realizar. Nos U.S. os aspirantes a microfonista ficam anos trabalhando só com os cabos e aprendendo a se comportar no set, ai começa a trabalhar de microfonista, lá se vão mais alguns anos, muitos param por ai! Pois tomaram consciência de sua incapacidade de assumirem a responsabilidade do som de um filme.

Você tem algum plano para o futuro, filmes engatilhados?

Tenho. Essa coisa de ter filmes para fazer daqui a um ano é muito legal. E eu comi muito pão que o diabo amassou, passei por períodos grandes sem trabalhar.

Qual o seu próximo projeto?

To indo pro Mato Grosso agora para fazer o filme do Marcos Ricca. É uma historia legal que se passa no Pantanal e envolve amor, tráfico de drogas e poder.

Você sempre lê os roteiros antes de trabalhar, ou escolhe pelo diretor/a?

Ainda não cheguei ao nível de descartar. Quando eu me aposentar eu não vou parar de fazer cinema, só que eu vou escolher o que fazer. Agora eu estou no patamar de já ter um filme para fazer no ano que vem.

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